12 de outubro de 2018

Pela criação de um Núcleo Museológico do Azeite

Conforme prometido, a propósito da exposição "Azeite - Ouro à Mesa" e da recente colocação à venda do último lagar hidráulico de Arouca, volto a este assunto e à defesa da criação de um Núcleo Museológico do Azeite.

Antes de mais, e ainda relativamente à excelente exposição sobre o Azeite com que fomos presenteados nesta última edição da Feira das Colheitas, defender que, tendo em conta a adequação e disponibilidade do espaço e a provável colaboração da associação responsável pelo mesmo, deveriam as exposições ali montadas (total ou, pelo menos, parcialmente) manter-se todo o ano, abrindo-se sempre que oportuno, funcionando como exposição temporária complementar ao Museu Municipal e à actividade daquela associação.
   
Depois, a propósito da recente colocação à venda do último lagar de azeite hidráulico, sito na freguesia de Rossas, dizer da excelente oportunidade para criação de um Núcleo Museológico do Azeite em Arouca. Aquele local e complexo, para além de adequados e apropriados, beneficiam de um enquadramento natural e paisagístico excelente para o efeito. A que acresce, como já tive oportunidade de defender, o facto desta freguesia necessitar de um investimento diferenciador e com potencial turístico. Não é necessário imitar o quer que seja ou quem quer que seja. Está ali a oportunidade.

Do ponto de vista histórico, está mais do que justificado. Lagares, azenhas ou engenhos de Azeite, existiram um pouco por todo o concelho. Pelo menos três em Alvarenga, dois em Santa Eulália, dois em Canelas, dois na Espiunca, um no Burgo e outro em Fermedo. Porém, quase todos encerrados na década de setenta do século passado, dada a sua rudimentaridade ou falta de sucessão no ofício de lagareiro. Tal como aconteceu com um primeiro e mais primitivo lagar existente no Salgueiro, nos limites de Rossas com Urrô. Do encerramento de todos, acabaram então por beneficiar os dois mais modernos existentes nesta freguesia, ambos na margem do rio Urtigosa. Mas também ali se moeu azeitona dos concelhos vizinhos, de Castelo de Paiva, de Cinfães, de Castro Daire, de Gondomar, de S. Pedro do Sul, de Vale de Cambra e Santa Maria da Feira. Com o encerramento destes, na década de noventa, beneficiou o único lagar (eléctrico) ainda hoje existente e em funcionamento, em Arouca, sito no lugar da Pena, na freguesia de Tropeço.

Quase todos aqueles lagares, no entanto, surgiram apenas após a extinção das Ordens Religiosas e a extinção do Mosteiro que, como se sabe, veio a acontecer mais tardiamente. Até, pelo menos, 1834, os arouquenses estavam obrigados a ir moer a azeitona ao lagar do Mosteiro, sito no lugar da Aborrida; e os rossenses estavam obrigados a ir moer a azeitona ao lagar da Comenda, sito no lugar do Pisão, pouco mais abaixo daquele. Eram, pois, os dois únicos lagares de azeite existentes no vale de Arouca.

Em novembro de 1718, o Visitador Geral da Ordem de Malta, aquando da sua Visita à comenda de Rossas, deslocou-se também ao Lagar, que destacou como uma das melhores propriedades da comenda, referindo, entre outros aspectos, o seguinte: «Tem esta Commenda hum Lagar de Azeite e algus Cazr.os se mostrão tão mal affectos à Commenda que vam moer fora do seu Lagar da sua, digo sua azeitona; e constandolhe q.e o Conv.to de Arouca põem depensao nos prazos q.e renova aos seus Cazeyros, que sempre moerão a azeitona no seu Lagar; e p.a que assim se pratique nesta Comm.da mandamos que nenhum Cazr.o possa moer a sua azeitona senão no Lagar da Religiam, e nos prazos que se renovarem se lhes faça esta advertência, que poderá vir a ser de importância por se plantarem agora na Comm.da muitas oliveyras.».



O complexo agora colocado à venda, fundado pela Casa da Vinha, ainda no século XIX, e passado depois à Casa de Telarda de Baixo, é o resultado de uma renovação profunda feita na década de cinquenta do século passado, altura em que tomou a denominação de «Lagar Moderno», como então se inscreveu na sua fachada, hoje já desgastada pelo tempo.

A Defesa de Arouca dá-nos notícia, em dezembro de 1956, que «se encontrava a laborar a bom ritmo, primando pela higiene e asseio». Em dezembro de 1991, «o lagar encontrava-se devidamente registado com o n.º 711 e devidamente reconhecido para laborar, por reunir todas as condições exigidas por lei». Em 1999, vítima das apertadas políticas agrícolas, fechou as suas portas.

Muito mais se poderá dizer para justificar a criação de um Núcleo Museológico do Azeite em Arouca e, especificamente, ali, em Rossas. Oxalá não se perca a oportunidade e não se suma o acervo!

Post scriptum (19.X.2018) - perdeu-se a oportunidade.