30 de novembro de 2018

EXPRESSO «ARDA-DOURO»...

Esta fotografia, tirada a partir do cume da Senhora da Mó, revela bem um facto muito claro, com validade ontológica, que quem não conhece Arouca devia saber. A Vila de Arouca, que tem cerca de 5 200 habitantes (sede de um concelho da Área Metropolitana do Porto e da Região Norte com cerca de 22 360 habitantes) localiza-se num vale de grande dimensão e não na Serra da Freita. A serra que está mais próxima da Vila de Arouca é a Serra da Senhora da Mó e não a Serra da Freita. A Vila de Arouca localiza-se no Vale do rio Arda, na Bacia Hidrográfica do rio Douro. As zonas de vale e de meia-encosta do concelho de Arouca são as mais populosas e não as zonas de serra, que são muito pouco populosas. Nesse sentido, a componente humana do concelho de Arouca que mais contribui para a definição identitária do concelho de Arouca como um todo, em termos estruturais, é, como sempre foi, forjada a partir da identidade das populações das zonas de vale e de meia-encosta do concelho e não das zonas de serra, que são exíguas em habitantes. A Vila de Arouca e o Vale do rio Arda, que se distende, depois, no espaço administrativo de várias freguesias arouquenses, para oeste e que se liga, em Rôssas, ao Vale do rio Urtigosa, são o território mais populoso que mais contribui, em termos de componente humana, para a definição identitária do concelho de Arouca como um todo. Não a Serra da Freita. 
Vila de Arouca, que se localiza no Vale do rio Arda
A Vila de Arouca localiza-se na área onde nasce e se forma o rio Arda (um dos afluentes estruturais do rio Douro), que se direcciona para o litoral e desagua em Pedorido, no rio Douro (a cerca de 7 Km das fronteiras norte e oeste do concelho de Arouca e a cerca de 22 Km da cidade do Porto), como se pode verificar nesta outra fotografia:
Foz do rio Arda, que desagua no rio Douro, em Pedorido,
a 7 Km do concelho de Arouca e a 22 Km do Porto
Há mais de três décadas atrás, a Aditur, uma das empresas de autocarros que existia em Arouca, criou um serviço de expresso diário (entre Arouca e o Porto e entre o Porto e Arouca) que se denominava «Expresso Arda-Douro». Essa designação é muito simbólica e reveladora da ligação muito forte que Arouca e os Arouquenses sempre mantiveram com o Porto e com o Grande Porto e da sua tendência de mobilidade sócio-económica para o litoral (as fronteiras oeste e noroeste do concelho de Arouca localizam-se, em linha recta, a cerca de 22 Km do Porto e a cerca de 19 Km do oceano Atlântico), a fazer lembrar a direcção do percurso do rio Arda, que nasce e se forma em Arouca, num percurso que se direcciona para o litoral, onde desagua, em Pedorido, no rio Douro, que, por sua vez, desagua na magnífica Foz do Douro, na cidade do Porto, no oceano Atlântico. Contudo, essa mobilidade não é unívoca, porque os Arouquenses vêem esses locais unidos e coesos, por fazerem parte, de modo dinâmico e permanente, da sua vida quotidiana, num espaço coeso e identitário que é habitado e vivido de modo contínuo. 
rio Arda e rio Douro: rios da Área Metropolitana do Porto
P.S.- Ainda a propósito da identidade...E estamos aqui a considerar a identidade do concelho de Arouca por referência às divisões territoriais identitárias mais vastas onde está inserido, num contexto macro...A identidade de um determinado território é, perfeitamente, definível, com conceitos racionais, com métodos e técnicas científicas: ela é apurada a partir dos elementos físicos, naturais, humanos e sociais autóctones e endógenos desse território, bem como da interacção dinâmica que ocorre, entre esses elementos, de modo espontâneo. Vários elementos civilizacionais exógenos podem, no entanto, associar-se a esse núcleo estrutural identitário mais originário e devem também ser sempre considerados, ao se considerar a evolução e o percurso histórico da identidade endógena desse território. Os vários ramos das Ciências têm capacidade para, com rigor, apurar a identidade autóctone de um determinado território. No domínio das Ciências Sociais, por exemplo, os conceitos de «área natural» (elementos autóctones) e de «área administrativa» (divisões territoriais e administrativas do Estado) da Escola Sociológica de Chicago (EUA) são úteis para dar inteligibilidade a um dos problemas do concelho de Arouca, em termos das suas divisões territoriais mais vastas, porque uma das graves lacunas administrativas de Arouca é o facto de pertencer, de modo arbitrário, desde 1835, ao distrito de Aveiro, já que o espaço urbano principal de referência de Arouca e dos Arouquenses sempre foi a cidade do Porto/Grande Porto, não apenas pelo facto de estar próximo, mas pelo facto do território identitário de Arouca se inserir nas divisões territoriais identitárias mais vastas protagonizadas pelo Porto e pela Região Norte que respeitam os elementos autóctones do território. E elas são, desde o início da nacionalidade de Portugal, a região de Entre-Douro-e-Minho e a região Norte e, durante o século XX, a província do Douro Litoral, que é a divisão territorial mais adequada para o território endógeno mais vasto onde Arouca se insere e que constitui quase a totalidade do distrito do Porto, que tinha, como cidade principal, a cidade do Porto. Ou seja, o concelho de Arouca está bem enquadrado, em termos endógenos, na região de Entre-Douro-e-Minho, na região Norte, na província do Douro Litoral e na Área Metropolitana do Porto, mas não está nada bem enquadrado, desde 1835, no distrito de Aveiro. Isso é um facto muitíssimo claro, evidente, com validade ontológica. Arouca, se se mantiverem os distritos, devia pertencer ao distrito do Porto. 
Arouca e os Arouquenses têm dado provas de boas práticas de desenvolvimento sustentado. Também é muito importante combater a anarquia irracional que, infelizmente, costuma caracterizar as várias divisões administrativas do território português. Nesse sentido, Arouca, os Arouquenses e as suas várias instituições devem empenhar-se em reforçar, cada vez mais, o enquadramento institucional do «território de mobilidade natural dos Arouquenses», que sempre foi protagonizada pelo Porto e pela Região Norte e que nunca foi protagonizada pela cidade de Aveiro. A ligação dos Arouquenses com Aveiro é, sobretudo, meramente, burocrática, como sempre foi, devido ao facto de, a partir de 1835, um concelho tipicamente nortenho e típico da Região do Entre-Douro-e-Minho ter sido integrado, de modo arbitrário e sem nexo, no distrito de Aveiro, que é uma cidade da Região Centro.   

29 de novembro de 2018

Desporto ou Desportos em Arouca

O desporto faz parte da vida do homem, da sua forma de conviver em sociedade e de construção da própria sociedade. Praticado de forma amadora ou profissional com muitíssimos níveis e motivos de prática intermédia o desporto é, por tudo o que representa, componente essencial da história do Homem. 

Em Portugal como em muitos outros países quando falamos ou escrevemos sobre desporto é o futebol que primeiramente nos vem à memória. De forma muitas vezes injusta são renegados para segundo plano outras centenas de desportos que se praticam com mais ou menos adesão e popularidade na sociedade portuguesa. Também em Arouca temos um espelhar desta forma de nos relacionarmos com esta actividade; procura no entanto este texto referenciar o que se tem vindo a modificar, particularmente em Arouca, no que toca a prática do desporto e versar sobre os desportos que se praticam. 

Obrigatoriamente, em Arouca, o Futebol Clube de Arouca é a referência máxima quando ao desporto concelhio nos queremos referir. Desde a década de cinquenta do século passado, com o Futebol de Onze e, mais recentemente, com o Futebol de Salão. Também o Grupo Desportivo Santa Cruz de Alvarenga, a A.C.R.D. de Mosteirô, a U.D. de Mansores e o C.C.R. de Vila Viçosa, são equipas no activo com prática desportiva de futebol federado sénior e algumas delas também juvenil. A União Desportiva de Fermedo e a Associação Unidos de Rossas são outras duas associações com prática de futebol federado juvenil.

O Centro Juvenil Salesiano de Arouca tem vindo ao longo dos últimos anos a tomar a dianteira na forma de fomentar a prática de outro tipo de desportos. É louvável que à data actual conte já com a prática e formação de desportos que vão para além do futebol (em que também são referência na formação jovem do concelho): natação, ténis, basketball, atletismo e, mais recentemente, voleibol, foram e continuam a ser uma lufada de “ar fresco” na prática desportiva Arouquense. 

Mais recentemente surgiu uma outra entidade: a SportArc, que vem, em meu entender, permitir um enquadramento desportivo legal a dezenas de desportistas amadores que praticam diferentes desportos: atletismo de estrada e de montanha, B.T.T., motociclismo e desportos motorizados, foram também enquadrados no “chapéu legal” desta nova associação. Os meus votos de uma linha e produtiva vida desportiva a esta associação.

Não são ainda muitos os desportos que se praticam de forma organizada e federada em Arouca, muito menos são aqueles que atrás referíamos em que é oferecida aos jovens de Arouca oportunidades de formação nos diferentes desportos. Se pensarmos ainda que no passado já se praticaram em Arouca e já existiram equipas e prática de desportos como rugby, hóquei em patins, ou até mesmo boxe, veremos que muito mais poderemos fazer.

Outro apontamento poderá ser efectuado ao facto de sermos um concelho com um potencial enormíssimo, já reconhecido em desportos de rio e radicais, e não termos até à data qualquer clube desportivo “dedicado” à formação nestas áreas. 

Muito de bom e de novo se fez e está a ser feito mas muito, muito mais, poderá e deverá ser feito.

28 de novembro de 2018

Quem foi Albano Ferreira?...

Na «Defesa de Arouca», desde a infância, muito convivi, de modo cordial, durante anos, com Arlindo Matos (cujo perfil biográfico está bem descrito, neste blogue, pelo seu filho António Matos) e com Alberto de Pinho Gonçalves, que faz a descrição biográfica (jornal «Discurso Directo»: 5-12-2014) do insigne etnógrafo arouquense Albano Ferreira, que foi um colaborador ilustre da «Defesa», cujas obras constituem alguns dos melhores e mais fidedignos textos que se escreveram sobre a identidade autóctone e endógena de Arouca e dos Arouquenses. Albano Ferreira viveu entre Arouca e o Porto e entre o Porto e Arouca.
Albano da Cunha Pinto Ferreira
« Vulgarmente conhecido como Albano Ferreira. Nasceu a 12 de Março de 1897, na Praça, Arouca. Filho de Ernesto Pinto Ferreira e Maria Carolina da Cunha Alegria. Neto paterno de José Ferreira de Oliveira, de Vila Nova, Burgo, e Maria Luísa da Conceição, do Rio de Janeiro, Brasil; e materno de João de Oliveira e Cunha, de Ovar, Chefe da Estação Telégrafo-Postal de Arouca, e Rita Ferreira Alegria, de Oliveira de Azeméis. O seu pai exerceu a profissão de escrivão-notário de Arouca.
Talvez a convivência paterna tenha influído na profissão que teve de escrivão judicial, em diversas comarcas do País, incluindo a de Arouca. Esta sua vivência com as populações, através da sua profissão, deu-lhe um conhecimento extraordinário de todos os aspectos etnográficos e antropológicos da população arouquense, que o apaixonaram toda a vida. Por tal motivo esteve durante muitos anos ligado ao folclore arouquense, e de um modo especial, ao Conjunto Etnográfico de Moldes, de que foi seu grande divulgador, nomeadamente nos anos 60, do século passado, conseguindo, através do seu grande amigo, o poeta Pedro Homem de Melo, ir várias vezes à RTP, mostrar o nosso folclore. Quem o quisesse ver zangado era falar mal do folclore e, de um modo especial, do Conjunto Etnográfico de Moldes.

A rua Albano Ferreira, numa zona central da Vila de Arouca
Ainda está na lembrança de muitos arouquenses, aquando da Feira das Colheitas, quando subia ao tablado o grupo de Moldes, para a sua actuação, ia também o «Albaninho» com a sua caixinha de cordões de ouro (pois ele tinha um grande espólio de peças de ouro antigas), e por sua mão os colocava ao peito das raparigas de Moldes, para a sua exibição. Pode dizer-se que era um «doente», no bom sentido, de tudo o que dizia respeito aos costumes e tradições das gentes de Arouca. Essa sua «doença» levou-o a escrever, durante muitos anos, na imprensa, principalmente no jornal “Defesa de Arouca”, belos artigos que mostram as vivências dos arouquenses, os seus usos e costumes, com uma prosa simples, objectiva e graciosa, que a todos deliciava. 

Não resisto a contar uma passagem que se passou na minha presença, há muitos anos. Trabalhava eu no dito jornal, onde ele colaborava, ainda sediado na rua Dr. Figueiredo Sobrinho (rua D´arca), num prédio hoje em ruínas. Naquela altura o jornal publicava uma secção denominada “Movimento Demográfico do Concelho”. Ora sobre os casamentos a notícia era dada mais ou menos nestes termos: fulano de tal, do lugar de tal, com fulana de tal, do lugar de tal, da freguesia de tal. Coincidiu que num casamento da freguesia de Canelas, em que há o lugar de Cima e o lugar de Baixo, saiu a notícia que dizia fulano de tal, de Cima, com fulana de tal, de Baixo. A perspicácia do «Albaninho» levou-o para a brejeirice. E então dirigiu-se ao jornal para adquirir um novo exemplar (talvez para guardar religiosamente...), e com grande satisfação, ria-se do caso. 

Não era pessoa religiosa; mas tinha em muitos padres os seus grandes amigos. De um modo geral tinha a simpatia de toda a gente, que o admirava e respeitava. Era um óptimo conversador. Mantinha um diálogo correcto e interessante com todos. Casou em 20 de Agosto de 1922, com Maria Helena Casimiro Leão Pimentel, natural da cidade do Porto, de quem teve dois filhos, o Alfredo e o Rui Pimentel Ferreira, creio que já ambos falecidos. Faleceu a 7 de Julho de 1978, na sua residência, na freguesia de Massarelos, Porto. A notícia do seu falecimento só chegou dias depois de ter acontecido, por sua expressa vontade. »(A.P.G.)

Para além das suas obras ainda não estarem compiladas e publicadas, convenientemente, em livro, a casa de Albano Ferreira do Porto, na rua de Vilar, em Massarelos, perto do Palácio de Cristal, encontra-se esquecida! Como é óbvio, em face destas duas situações lamentáveis, a Câmara Municipal de Arouca, bem como as instituições de Arouca, da Área Metropolitana do Porto e da Região Norte ligadas à cultura, deviam interessar-se, impreterivelmente, por elas, publicando as obras completas de Albano Ferreira e adquirindo a casa de Albano Ferreira do Porto, que poderia funcionar como uma Casa da Cultura Arouquense no Porto, com vários tipos de actividades, numa dinâmica vital e identitária que consolidasse, ainda mais, a forte ligação que Arouca e os Arouquenses sempre tiveram com o Porto e o Grande Porto. Na contemporaneidade, através da acção permanente de várias instituições, como a Área Metropolitana do Porto ou a CCDR-N, esse território identitário deve ser ainda mais solidificado e tem de estar sempre vivo, sadio, ético e dinâmico.


27 de novembro de 2018

A Pensar Alto... O Café.

Os primeiros cafés ou cafetarias apareceram em Portugal no séc. XVII inspirados nas tertúlias francesas. Tornam se espaços de animação cultural e artística e são os locais preferidos de diplomatas, artistas, intelectuais e escritores entre outros. Surgem principalmente em Lisboa espalhando se depois pelo resto do País. Os cafés nos dias de hoje têm uma função social muito importante e estão disseminados por todas as vilas e freguesias do País. Arouca não é exceção. Locais de muitas conversas e muitas histórias, cá vai uma. 

O Costinha, nunca percebi porque lhe chamavam assim, era um homem de mais de 100 kilos, mais de 1.90m de altura, com umas mãos de dedos longos, que nos adivinhavam o pedido, pois de repente aparecia como que abandonado no balcão, quando falava as palavras soavam enormes por pequenas que fossem, e apesar disto e de outras coisas semelhantes era sempre o Costinha como se este tratamento o tornasse mais próximo de nós, pequenos e poucos clientes. E a voz? Parecia sempre acima do tom, quase nos lembrava o tempo das cavernas, se como me contaram era preciso falar grosso para se ter o respeito dos companheiros. Então quando o seu clube de futebol preferido perdia, já ouvi trovões em noites de temporal, mais tímidos e singelos. Ficava mais enorme, mais gigante, mais vermelho que um pôr do sol de verão, e soltava um ou vários palavrões que nem vou repetir porque me ocupavam o resto da folha. Mas era sempre o Costinha, o amigo, o confidente de muitas más e boas horas que o calendário tem guardadas, e o contador de novidades, algumas tão surpreendentes que nunca chegaram a acontecer. O Costinha. E sabia sempre tudo. Como dizia por entre gargalhadas e ares de matreirice, era especialista nos 4 esses, o de sexo, o de sangue, o de segredos e o mais importante, o de solidão. Quem roubou as armas em Tancos? Lá vinha resposta certeira sem contestação, Se alguém ia ser preso por tanta aldrabice e tanto roubo? Com ar sério, a questão era grave lá vinha resposta pessimista, Onde esconderam o corpo? Às vezes até parecia que era ele que o escondia tal a certeza, O homem era corrupto ou não? dependia da côr partidária mas as hipóteses da tentação são muitas..Problemas conjugais era especialista e desconfio que até passou uma fase em que era meio conselheiro matrimonial ,no tempo em que se pensava que o casamento era para durar. Era infalível, qualquer questão que aparecesse o Costinha à vontade nas respostas, sem pestanejar. Ouvi-lo era muito melhor que assistir aqueles comentários de ilustres na tv pois nem precisava de um ar tão sério, nem de tirar um curso de Dr. nos fins de semana. Um dia faltou às conversas do costume, quem nos atendeu foi o seu empregadito, uma espécie de aprendiz sem jeito que lhe servia mais de companhia que de utilidade para descansar do trabalho, e apesar de todos repararem nas respostas evasivas ninguém fez insinuações ou levantou questões, esperou-se. Quando se adivinham notícias desagradáveis é melhor ir adiando, como quem acredita em milagres. No dia seguinte e nos outros nada, e então começaram as dúvidas que logo foram certezas. Nada de bom, doença daquela que ninguém quer, poucas esperanças, daquela novidade não tinha ele falado, como se fosse possível o esquecimento trazer a cura. Mas não trouxe. Alguns dias depois, não contei mas foram poucos, a surpresa do aviso. E dessa vez, e pela primeira vez o Costinha pareceu me pequenino a fazer juz ao carinhoso diminutivo. A foto que acompanhava a noticia que com enorme tristeza colocaram na parede exterior do seu café, onde, apesar do desconforto da roupa domingueira, o ar sorridente, o cabelo penteado, o olhar a prometer novidades, pela primeira vez o Costinha me pareceu pequenino, ali encostadinho no lado esquerdo da folha, meio a contra gosto para dar espaço ao resto da noticia. Na foto que ilustra a noticia onde os grandes são pequenos e os pequenos grandes, tudo igual. Triste dia. Nunca mais vai ser igual o serão no café naquela Vila. Falta por lá o Costinha.

26 de novembro de 2018

A favor de uma Pousada no Mosteiro, mas...

Em sequência do já anunciado há algum tempo, com a criação do Projecto Revive (que tem em vista a recuperação e valorização do património cultural e histórico, presente em todo o território nacional, e a sua transformação em activo económico para o país), na passada sexta-feira, 23 de Novembro, o Instituto do Turismo de Portugal lançou o Concurso Público para a concessão da exploração de uma unidade hoteleira no Mosteiro de Arouca, por 50 anos. O prazo para apresentação de propostas corre agora por três meses.

Há já alguns anos que defendo também a instalação de uma unidade hoteleira no Mosteiro, nomeadamente, para salvaguarda, manutenção e dignificação de uma parte hoje totalmente devoluta, mas, no entanto, nunca com a ambição do que está agora projectado. Defendia apenas, e ainda defendo, a instalação de uma Pousada, mas, exclusivamente na parte Nascente da Ala Sul (assinalada na imagem).


O caderno de encargos do Concurso agora lançado prevê a concessão de toda a Ala Sul do Mosteiro e a quase totalidade da Cerca (demarcada na imagem abaixo), com vista a adaptação, inclusive com possibilidade de construção em parte da Cerca, para posterior exploração para fins turísticos, como estabelecimento hoteleiro, estabelecimento de alojamento local ou outro projecto de vocação turística com elevados padrões de qualidade, que privilegie o alojamento, podendo ainda incluir outras valências como restauração e lazer.

Ainda de acordo com o programa e respectivo caderno de encargos, - que ignora a ocupação do 2.º Piso da parte Poente pela Associação de Defesa do Património Arouquense -, da área a concessionar, apenas o Pátio dos Comuns e o espaço de acesso a este, através do Largo Santa Mafalda, funcionarão como espaços de utilização partilhável, mas com acesso condicionado, para serventia do museu. Os restantes espaços ficarão exclusivamente afectos ao uso privado do empreendimento turístico. Fica, no entanto, salvaguardado o direito ao acesso público à Cerca, para visitas guiadas e previamente agendadas, em três datas comemorativas nacionais e uma municipal: o Dia da Rainha Santa Mafalda.


Confesso que não antevejo muito provável a candidatura nem muito viável a instalação de uma unidade de 5 estrelas, como já chegou a ser aventada, mas, também não será de ver com bons olhos a instalação de uma unidade de gama inferior, com aquela dimensão. Sendo certo que, apesar da muito boa qualidade das unidades hoje existentes em Arouca, um hotel de 5 estrelas dificilmente concorreria com aquelas, mas, já uma unidade de gama inferior, com a aliciante do edifício em causa, certamente que concorrerá e poderá mesmo comprometer a viabilidade de algumas delas. Factor que não deverá ser subestimado pelas entidades que têm ou podem ter uma palavra a dizer neste processo.

Contudo, sendo já a segunda vez que a procissão a esta santa sai da igreja, está ainda no adro... a aguardar quem pegue no andor... E, manifestamente, há agora muito mais a dizer. Será, pois, uma boa altura para que muito boa gente, com responsabilidades acrescidas, volte a reflectir e a pronunciar-se sobre o tema, também na perspectiva de ganhos e perdas, e dos interesses de Arouca e dos arouquenses a salvaguardar.

25 de novembro de 2018

Homo sapiens arouquensis? A identidade dos arouquenses


   Dei comigo há dias a folhear o livro “Entre Freita e Montemuro”, editado em 1997 pela Associação para a Defesa da Cultura Arouquense. Tem boas sínteses sobre as características geológicas e naturais do chamado maciço montanhoso da Gralheira – ao qual pertence parte do território de Arouca – e sobre a identidade tradicional das comunidades humanas que o habitam. Dá particular destaque à serra da Freita, sobretudo nas fotografias que publica.
   Transcrevo, deste livro, cerca de metade da conclusão do texto “Um pouco de História”, de Filomeno Silva, que versa sobre a identidade dos arouquenses:
   “Tudo o que de uma forma linear procuramos mostrar é aquilo que melhor define a identidade cultural de um povo e de uma gente. Por mais que queiramos ou pretendamos estabelecer paralelos entre estas gentes e as ditas da ‘Terra de Santa Maria’, além de ser uma pura retórica senão ilusão, são interesses mesquinhos de quem pretende apropriar-se de valores ímpares, únicos e indissociáveis destas gentes. Além disso, Arouca historicamente nunca pertenceu a essa terra que vai desde Vila Nova de Gaia até quase Estarreja. Por isso Arouca sempre dispôs de autonomia, bem definida pelo Arda e pela Freita – não é terra do interior mas também não é litoral.
Do Minho tem a verdura dos seus campos e a abundância da água que a converte num dos rincões mais férteis do país. De Trás-os-Montes tem a graciosidade das suas paisagens, a hospitalidade dos seus habitantes e a majestade das suas elevações. Nas courelas onde mal cabe um arado, persistem as pessoas apegadas à terra. Nos nossos dias até se torna impensável como é isto possível. São esses factores que separam os arouquenses dos seus vizinhos mais litoralistas e ao mesmo tempo melhor definem esta terra como um povo e uma gente diferente e extraordinariamente dotada de valores humanos, culturais, paisagísticos e gastronómicos.”
   Foi esta, era esta há 20 anos a identidade dos arouquenses?
   Uma comunidade, salvo raras exceções, é um conjunto de comunidades mais pequenas e uma parte de comunidades maiores. Tem modulações históricas, permutas e mobilidades que tornam difícil representar a sua identidade. Pode correr mal àqueles que tentam defini-la; como tudo na vida, não corre mal àqueles que não tentam.
   Como definiríamos, em síntese, a identidade dos arouquenses de hoje, se possível fosse?

Uma ‘Cana Verde’ sublime, que entoa Arouca e os Arouquenses: autêntica e telúrica!...


Esta ‘Cana Verde’, de um dos melhores períodos do Conjunto Etnográfico de Moldes de Danças e Corais Arouquenses (uma das instituições identitárias estruturais de Arouca), é sublime e comovente!...Penso que não há palavras para descrever a pureza e a autenticidade dos sons desta versão desse período, que entoa, de modo genuíno, Arouca e os Arouquenses...:
Na origem desta autenticidade autóctone de uma dança típica do Douro Litoral (que tinha, como capital, a cidade do Porto), está a obra de muita qualidade de um dos colaboradores ilustres do jornal «Defesa de Arouca»: o insigne etnógrafo arouquense Albano Ferreira, que legou, a Arouca, nas páginas da «Defesa», alguns dos melhores e mais fiéis textos que, alguma vez, se escreveram sobre Arouca e sobre os Arouquenses. Obra inigualável que era posta em prática, no Conjunto Etnográfico de Moldes, pela acção dirigente de outro arouquense ilustre e personalidade central e estruturante do grupo: Fernando Miranda. E, mais uma vez (nada melhor para comprovar esse facto, através destes dois arouquenses ilustres), se constata a forte ligação dos arouquenses e de Arouca à cidade do Porto, que continua a ser a capital identitária do Douro Litoral, que é o território autóctone da 'Cana Verde' e que é o espaço mais vasto onde a identidade de Arouca e dos Arouquenses melhor se enquadra.  

24 de novembro de 2018

Recuperação das antigas Casas Florestais

Vai para dezasseis anos, o Governo de então, através do Ministério da Agricultura, resolveu proceder à cedência por vinte anos, em regime de comodato, de 287 casas florestais desactivadas. Podiam candidatar-se pessoas colectivas ou singulares, desde que prosseguissem objectivos compatíveis  com o desenvolvimento das zonas rurais, com a preservação dos recursos naturais e da paisagem e com a manutenção do ambiente. Intenção que não passou disso mesmo.

Há meia dúzia de meses, o actual Governo recuperou e refrescou a ideia de fazer alguma coisa com esse património, manifestando agora a intenção de, por iniciativa própria, recuperar essas antigas casas para fins turísticos. Segundo a intenção manifestada, por esta altura, estarão a ser identificados os imóveis que integrarão esse novo programa. Segundo o Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF), entidade responsável pela gestão florestal, existem agora disponíveis cerca de mil casas florestais espalhadas por todo o país. Em Arouca existem quatro.

Casa Florestal do Merujal,
tirada de “onossorasto.blogspot.com”
Relativamente às casas existentes em Arouca, que, tal como os Viveiros da Granja, resultaram do Plano de Povoamento Florestal de 1938, reforçado e ajustado entre 1954 e 1972, essa intenção só será aceitável se, por desinteresse do Município, não surgir entretanto uma alternativa melhor - isolada ou em parceria com outra entidade concelhia -, que socorra aqueles imóveis da degradação e vandalização a que estão deixados pelo Estado desde a década de oitenta.

Porque, se assim não for e algum dia vier a concretizar-se aquela intenção do Governo, será uma péssima notícia para um concelho com pendor turístico, nomeadamente para o turismo de natureza, como é o nosso. Pior ainda, se se tratar de uma medida a reverter proventos para uma qualquer empresa pública nacional ou fundo imobiliário, que o mesmo é dizer para os sacos sem fundo do Estado.

Com efeito, parece-me muito lógico que a recuperação e rentabilização destas casas, à semelhança do que está a ser feito por outros municípios, deva ser reclamada pela Câmara Municipal, de forma a que a sua utilidade ou resultados de uma eventual exploração turística, revertam para o concelho e, nomeadamente, para a recuperação e manutenção das florestas em que se encontram inseridas. Ou até mesmo para voltarem a ser uma espécie do que já foram, adequando-se a apoio logístico à prevenção de incêndios e ao tão propalado reordenamento florestal - com que (para já, e também desde a década de oitenta...) apenas se enche a boca quando o "diabo" nos visita e consome ou quando se abeiram eleições.

Durante muitos anos, serviu de desculpa à falta de ideias a propriedade estatal das referidas casas e, por isso, a alegada impossibilidade da Câmara poder fazer alguma coisa. Porém, a ineficiência do Estado, por um lado, e as oportunidades que têm sido criadas, por outro; a recuperação e valorização que vai agora ser feita (e muito bem!) nos Viveiros da Granja, bem como o que já foi e está a ser feito noutros concelhos, contrariam aquela desculpa e alegada impossibilidade.

Por isso, só por culpas próprias, nossas, se perderá a oportunidade de recuperar e rentabilizar a favor de Arouca também as Casas Florestais do alto da Freita e do monte da Senhora da Mó.

23 de novembro de 2018

Sá de Albergaria, portuense ilustre, com Arouca no coração


António José da Costa Couto Sá de Albergaria foi um reconhecido escritor, jornalista e pedagogo portuense, que nos deixou um interessante legado literário, do qual destaco os romances “Os Meus Pecados” (1878), “Noites do Porto” (1879), “O Segredo do Eremita” (1902), “Irmã Doroteia” (1902) e “Os filhos do Padre Anselmo” (1904). Utilizou também os pseudónimos João Chorinca e Gabriel da Rasa.
Enquanto jornalista, foi colaborador do “Jornal de Notícias” onde manteve, durante anos, a mordaz crónica "DE RASPÃO - Collecção de artigos humoristicos de critica política, litterária e de costumes”, mais tarde editada autonomamente pela editora “Agência de Publicações”.
Fundou e dirigiu uma conceituada escola na Foz, por onde passaram várias gerações de alunos.
Sá de Albergaria, nasceu a 15 de Agosto de 1850, na quinta da Lameira, freguesia de Urrô, concelho de Arouca. Era filho de António José da Costa Couto, natural da vila de Tabuaço, e de sua mulher D. Maria de Sá Rebelo Vasconcelos e Albergaria, natural da freguesia de Cedofeita, da cidade do Porto; neto paterno do Dr. Luís José da Costa Couto e de D. Maria Cândida Alves de Gouveia, da referida vila de Tabuaço; neto materno de José António de Sá Rebelo e Vasconcelos, também natural da vila de Tabuaço e falecido a 3 de Maio de 1855, na vila de Moimenta da Beira, e de D. Joaquina Leite Soares de Albergaria, nascida a 3 de Outubro de 1792 na Vila de Freixieiro, da freguesia de Britelo, concelho de Celorico de Basto. Foram seus padrinhos de baptismo os nossos bem conhecidos João Pinto Varela e D. Francisca Cândida de Sá Pereira Pinto Rebelo Aranha, sua mãe, da quinta da Lameira.
Não fossem as pistas lançadas por alguns sobrenomes comuns à gente da Lameira, e que decidi seguir, as circunstâncias que envolvem o seu nascimento em Arouca, permaneceriam obscuras.
Afortunadamente, a pesquisa da ascendência do avô materno de Sá de Albergaria, veio a desvendar parcialmente o enigma: José António de Sá Rebelo e Vasconcelos, era primo direito de D. Francisca Cândida, por ser filho de D. Maria de Sá Rebelo, irmã inteira de Francisco de Sá Rebelo Aranha Pereira de Aguilar, avô da senhora da Lameira, ambos naturais da freguesia de Arcozelos, Moimenta da Beira. É pois possível que o seu nascimento em Arouca tenha ocorrido acidentalmente, no decurso de uma visita social aos parentes de Arouca.
Não duvido, no entanto, do carinho que o ligava a esta terra, pois nunca deixou de, orgulhosamente, dizer que era natural do concelho de Arouca.


Ascendência de Sá de Albergaria

22 de novembro de 2018

Hoje é dia de Benfica-Arouca (e do tanto que mudou...)

Foto: Liga Portugal
No dia 16 de Outubro de 2010, jogou o Futebol Clube de Arouca no estádio da Luz, tal como hoje, para a Taça de Portugal.

À data, tal evento, constituiu o momento mais importante de um clube fundado 57 anos antes, no dia de Natal, mas que, apesar do simbolismo do dia do seu aniversário, nunca havia recebido tamanha prenda, em contexto de competição. Muito embora já registasse dois encontros com o Futebol Clube do Porto, que muito honraram o clube e as gentes da vila, estes aconteceram em tom de “jogo amigável”.

Portanto, naquele dia encheram-se todos os arouquenses de orgulho e, mesmo que alguns com o coração dividido, vestiram orgulhosamente a camisola do clube da terra e festejaram todo um percurso que se havia iniciado poucos anos antes, ainda o FCA jogava nos distritais.

O percurso, que naquele jogo assumia contornos quase épicos, e que envaidecia todos aqueles que gostavam de Arouca, havia começado com muita desconfiança e até oposição de uma grande maioria dos adeptos do clube. Não faltava quem dissesse que o Arouca era clube para distritais (como sempre havia sido) e que se lá não jogassem jogadores do concelho, que se recusavam a assistir aos jogos. Esta atitude nada tinha de criticável. Era o que era. Os arouquenses, à época, eram bem mais resignados que no presente e, talvez por isso, não se sentissem absolutamente confortáveis com horizontes demasiado descerrados, que os fizessem sair da sua zona de conforto.

Naquele estádio, tudo se esqueceu. Apenas se celebrou o exemplo que um clube de uma vila tão pequena estava a dar ao país. O resultado não interessou. Apenas se celebrou o exemplo que um clube de uma vila tão pequena estava a dar ao país.

Não imaginavam os arouquenses que ainda mais estava para vir.

Hoje, depois do FCA ter passado pela primeira liga de futebol, jogar esporadicamente, para a Taça de Portugal, no estádio da Luz já sabe a pouco. O que os arouquenses querem é o seu clube a jogar nos principais estádios portugueses, todas as semanas.

A exigência e a ambição dos arouquenses mudou. Hoje todos nós queremos sempre mais e melhor, não só no futebol, como em tudo o que envolve o nome Arouca. Hoje não nos contentamos com o pouco. Hoje somos mais exigentes. Hoje não nos resignamos aos circunstancialismos da vida. Hoje lutamos.

Não sei se estarei a exagerar, mas se for esse o caso, permitam-me o exagero. Julgo que muita desta nova ambição arouquense começou precisamente no caminho que o FCA traçou e na forma como potenciou um sonho no qual sempre acreditou.

Que o jogo de hoje sirva para reforçar a ambição em regressar a um sítio que já foi o nosso.

21 de novembro de 2018

Grandes imprecisões sobre Arouca nos «mass media» nacionais

São muito frequentes as grandes imprecisões sobre Arouca, difundidas nos «mass media» de impacto nacional, sobretudo dos que estão localizados em Lisboa, que padecem de um certo ultra-centralismo autista, petulante e provinciano de Lisboa e arredores, que, na minha sincera opinião, não é uma boa suposta capital para o país como um todo, em parte, precisamente, devido a esse ultra-centralismo político e administrativo, que é mesmo excessivo, auto-centrado e auto-referente e que, portanto, não é nada benéfico para os cidadãos de Portugal, bem como para o desenvolvimento sadio, equilibrado e justo de todas as regiões do Estado português... Algumas dessas imprecisões são mesmo muito irritantes, dado que são erradas e são repetidas com frequência e podem ser aceites, como verdadeiras, por uma parte considerável das pessoas que as acolhem.


Uma delas, entre outras, prende-se com a nomeação, num tom discriminatório e pouco elegante, que se faz do Futebol Clube de Arouca (e, de modo concomitante, dos seus adeptos, sendo a maioria deles Arouquenses), como o «clube da Serra Freita», o «clube serrano», «os serranos» ou «os aveirenses»... Como se, em Lisboa, também não existissem colinas e montanhas e como se não existissem serras no distrito de Lisboa!... A equipa de futebol do Estoril, que está sediada em Alcabideche, no concelho de Cascais, distrito de Lisboa, está tão próxima da Serra de Sintra (que se localiza nos concelhos de Cascais e de Sintra), como a Vila de Arouca da Serra da Freita. Talvez até mais próxima... Porque é que também não nomeiam, de modo análogo, a equipa de futebol do Estoril como «o clube da Serra de Sintra», o «clube serrano» ou também como «os serranos»?... Aí seriam, como é óbvio, «os serranos da Serra de Sintra» e não «os serranos da Serra da Freita»... 
Como se sabe, a Vila de Arouca não se localiza na Serra da Freita, mas sim no Vale do Rio Arda, um vale fértil de grande dimensão onde nasce um dos afluentes estruturais do rio Douro, na Bacia Hidrográfica do rio Douro. A serra que está mais próxima da Vila de Arouca não é a Serra da Freita, mas sim a Serra da Senhora da Mó e o Futebol Clube de Arouca, que está sediado na Vila de Arouca, no Vale do Rio Arda, que representa o concelho de Arouca como um todo, não pode ser vinculado unicamente a uma, entre as várias serras que existem no concelho de Arouca, nem muito menos somente a uma que não é a mais próxima da Vila de Arouca e que não é exclusiva do concelho de Arouca. E, se Arouca tem várias serras, também tem vários vales, vários planaltos e várias meias-encostas, que sempre tiveram mais importância que as serras, como é o caso, precisamente, do Vale do Rio Arda, que tem uma centralidade muito maior que a Serra da Freita, no contexto geral do concelho de Arouca. Para além disso, repetimos, a Serra da Freita não é exclusiva de Arouca, porque também se distende, numa parte considerável, aos concelhos de Vale de Cambra e de São Pedro do Sul.
Seria muito mais adequado e verdadeiro, nesse sentido, apelidar o Futebol Clube de Arouca como o «clube do Vale do Rio Arda» ou o «clube do Vale do Arda». Embora alguns desses «mass media» nacionais já nomeiem (e aí correctamente...) o Futebol Clube de Arouca de «clube nortenho» ou de «emblema nortenho».
Assim, a denominação de «aveirenses», para uma equipa nortenha de um concelho que se localiza apenas a cerca de 35Km, por estrada, da cidade do Porto, em plena Área Metropolitana do Porto, também é muito irritante, porque é muito errada. Os Arouquenses não são, como nunca foram, Aveirenses, para além da sua ligação a Aveiro ter sido sempre escassa e fugaz, ao passo que, em relação ao Porto, a ligação dos Arouquenses sempre foi muito forte e, no futuro, será ainda mais forte. Tanto mais que o insigne Futebol Clube de Arouca encontra-se, desde a sua génese, fortemente ligado ao invicto Futebol Clube do Porto.

20 de novembro de 2018

A Pensar Alto... O Circo.


De tempos em tempos, como se fosse uma visita de velhos companheiros, recebemos cá por Arouca uma companhia de circo. Sem datas marcadas, sem grandes avisos, só damos por eles quando se começam a instalar quase sempre ali à entrada da Vila na Rotunda do Lavrador, e a espalhar pelos sítios do costume e ondas da rádio, os pequenos avisos gastos de muito repetirem as mesmas proezas, anunciando os espetáculos que irão fazer sorrir as crianças e sonhar muitos adultos. Para mim e por ser cá, o circo é sempre melhor e diferente...
O espetáculo do circo iniciou se no séc.200 a.C. e era um divertimento necessário para evitar atos revolucionários. De lá para cá foi adotando diversas cambiantes, manteve se sempre com atitudes de lazer e distração, refinou a magia e o encantamento, inventou mais truques e motivos de curiosidades, mas ganhou concorrentes muito mais modernos, eficientes e poderosos. A maior parte das companhias que nos visitam são humildes com reportório muito limitado, sem grandes adereços, animais selvagens substituídos por pequenos domésticos que muito se esforçam para parecerem suplentes à altura, pássaros de uma brancura esmerada que só lhes falta falar, instalações que já viram melhores dias, e artistas multifacetados que saltam do trapézio para palhaços ou malabaristas, com a magia e habilidade a nunca faltar para deleite dos nossos olhos. Nos intervalos vendem pipocas e pequenas máquinas com luzes e sons que fazem lembrar a India, o Paquistão ou a China, mas que as crianças desejam mostrando como o Mundo está global e tudo serve para quebrar o enfado da TV e dos smartphones dos pais. Daí para a frente, vontades satisfeitas, assumem uma postura de recato e bom comportamento, quiçá por influência das luzinhas e monotonia dos acordes. Depois deste espaço é até possível para os mais audazes, calcar a pista ondulada pelas muitas voltas, no dorso de um cavalinho, mesmo ao lado de um verdadeiro artista, e sentir mais intensamente esta magia de cavaleiros em busca de novas descobertas. Depois falta mesmo é esperar pelas atrações finais. Aí as estrelas do espetáculo, podem transformar-se em domadores, mágicos ou porteiros, e até colocam a vida em risco como diz com sotaque e tremuras de aflição o apresentador, subindo para um canhão e sendo projetados como homens bala, mas para perto, que nos dias de hoje prenhes  de dificuldades a pólvora é quase toda sêca e o corpo é frágil e desarranja-se num instante. O que não perdem é a dignidade e o orgulho de pertencerem a uma classe de nómadas dos tempos de hoje e levam a vida que muitas vezes identificamos com alegria, prazer, viagens, descobertas e imensa felicidade, tudo muito embrulhado em ambientes de mistérios e surpresas de espantar. Sempre que cá vêm são bem recebidos e mudam radicalmente o dia a dia de muitas crianças desfavorecidas ou não. Até os pais agradecem. E os avós já agora. Para mim nunca foi sacrifício visitar o circo e partilhar aquelas emoções com os meus filhos e agora netos. Sempre que posso vou acompanhá-los. Desta vez fiquei surpreso com a magia, tinham uma máquina que trespassava um corpo e nem um ferimento acontecia, espada para cá, espada para lá e nada. O artista tanto estava aqui, como aparecia acolá. Seria com um caixote destes que o membro da Assembleia que faltava estando presente conseguia tal proeza? E aqueles ares de inocentes dos sempre falsamente acusados, tão em moda no desporto, nos criminosos, de grandes ou pequenos delitos, teriam eles aprendido com os palhaços ricos, aquele ar sorumbático? Ou com os palhaços pobres? Com estes não, que é o mais o nosso papel. Grande circo por aí anda. Tinha assunto para deixar o picadeiro, vermelho de vergonha. Continuo a preferir os que nos visitam, sei o que vou encontrar e melhor ou pior, com os pés quentes ou frios, faça chuva ou calor, num banco torto ou numa bancada a tremer das emoções, sinto aquela vertigem de olhar para o pequeno trapézio que anda para cá e para lá, vou espreitando para a gasta cortina que serve de entrada a tantas surpresas boas, dou umas boas gargalhadas, respiro aqueles pedacinhos de aventura e mistério e até estremeço de susto quando um cão feroz ou outro animal disfarçado de tal dá um salto maior para apanhar um pedaço de prémio. No circo temos que acreditar em tudo. Para a próxima não se esqueçam, venham ao circo.

Os acessos directos e funcionais ao concelho de Arouca

 O território da Área Metropolitana do Porto é a principal porta de entrada, via terrestre, via ferroviária, via aérea, via marítima e via fluvial, de acesso ao concelho de Arouca, que se localiza em plena Bacia Hidrográfica do rio Douro.

Os acessos directos e funcionais ao concelho de Arouca
 Extinta a NUTS III de Entre-Douro-e-Vouga (o que foi um acontecimento muito acertado, porque era e é um erro apartar os concelhos do extremo norte do distrito de Aveiro dos concelhos do denominado 'Grande Porto'), a Área Metropolitana do Porto (AMP) é a actual NUTS III onde Arouca, com toda a razão e com todo o direito, se insere, protagonizada pela cidade do Porto, que sempre foi a cidade principal de referência para Arouca e para os Arouquenses. A prioridade das prioridades, para Arouca, em termos de acessos, é a conclusão da variante à EN326, que vai tornar, muito mais rápido, directo e funcional, o acesso e a mobilidade de pessoas, bens e serviços ao concelho de Arouca, a partir do litoral da AMP, via aérea (Aeroporto Francisco Sá Carneiro e Aeródromo Municipal da Maia), via ferroviária (Estação Ferroviária de Porto-Campanhã), via marítima (Porto de Leixões e Marina 'Porto-Atlântico') e via fluvial (Marina 'Douro-Marina' e Marina do Freixo), bem como a mobilidade inversa a partir de Arouca. No futuro, com a conclusão da variante à EN326, a deslocação, de automóvel, pela A32, entre o Porto e a vila de Arouca, sede do concelho, demorará cerca de 35 a 40 minutos.

19 de novembro de 2018

Ternura dos 40

Ontem fiz 40 anos.
Meio caminho de uma vida entre aqui e aí.
Metade para trás e outra metade para a frente.

" Foram tantas as idades
Da vida que atrás deixei
Não quero sentir saudades
Vou em outras amizades
Amar o que [ainda] amei "

Retrospectivamente, passei por vários estados na minha relação com Arouca, mas sempre mantive o mesmo fio condutor: o orgulho das minhas raízes e o desejo de transmitir este amor por este cantinho de Portugal. Do perímetro limitado do quintal dos meus avós, caminho na vida fazendo, alarguei o meu perímetro de descobertas e tenho mantido constantemente o mesmo olhar espantado para todos esses elementos que tornam Arouca um bem comum mesmo à parte. Falo de um património e de uma história que forjam sua grandeza mas também, e especialmente, homens que por seu apego indefectível a sublimam. A riqueza de Arouca é isso mesmo.

Como já o mencionei num artigo anterior, não foi sempre fácil fazer entender toda a beleza e poder da alma do MEU Arouca. Foi difícil anos após anos justificar isso. Hoje é quase fácil demais. Não vou listar os artigos publicados aqui e ali e os inúmeros prémios recebidos. Durante anos, os meus primeiros 30, tantas vezes os procurei. Porém, «Foram tantas as idades / Da vida que atrás deixei».

Estes últimos 10 anos têm sido fortes em razões de orgulho (Geopark, FC Arouca e companhia), que me permitiram justificar FACTUALMENTE o carácter excepcional de Arouca e dos arouquenses. Para meu aniversário dos 40 anos, Arouca foi nomeado "município do ano". Belo presente de aniversário. Mais água para accionar o meu moinho de embaixador de Arouca...

"Não quero sentir saudades
Vou em outras amizades
Amar o que [ainda] amei"

Estou hoje no meio do vau. Que venham mais razões para me orgulhar. Que possa descobrir e redescobrir Arouca para «Amar o que [ainda] não amei»


Até breve neste meu Arouca do relembrar e da saudade!

O Sobreiro

Morreu o Sobreiro do Calvário e, por isso, cortaram-no!!!

Morreu?!... Mas quando é que se morre? Na minha perspectiva, no meu sentir, morre-se quando as pessoas ou as "coisas" não ficam dentro de nós, não ficam no nosso coração, não ficam na nossa memória. Por isso, eu tenho a certeza que ainda levará muitos anos até que o Sobreiro morra. Ele atravessou gerações, ele "conheceu" muita gente, ele foi abrigo para namorados, ele foi confidente de alegrias, tristezas, planos, revoltas...

Subir a escadaria do Calvário ou atravessar a "montanha de granito" e sentar-se debaixo da cúpula do Sobreiro ficando a olhar a Serra da Freita, o Convento, a Vila e muito do verde que o Vale de Arouca oferece, ou então, sentar-se debaixo dele à noite, no escuro da sua sombra, e procurar, no Céu, a Ursula Maior, a Menor, a Orion e a Estrela Polar foi um privilégio de alguns. Tenho a certeza que não foi privilégio de todos! E para quem teve esse privilégio, O SOBREIRO DO CALVÁRIO AINDA NÃO MORREU.

Naturalmente, digo eu, terá morrido para quem o conheceu menos, para quem não usufruiu do bem estar que ele oferecia, para quem não lhe confidenciou nenhum segredo; terá morrido para os turistas que visitam o Calvário e para os quais o Sobreiro era apenas uma árvore grande e velha; terá morrido para muitos daqueles que, no dia da Procissão dos Fogaréus, se sentavam debaixo dele enquanto o padre fazia a pregação... porém, tal como já disse, o Sobreiro ainda vai atravessar a minha geração, a que vem atrás de mim e a que vem atrás desta.

O Calvário está mais pobre, porque o Sobreiro secou, desapareceu. O Calvário perdeu parte da sua beleza, porque o verde do Sobreiro que fazia harmonia perfeita com o cinzento do granito, também desapareceu. Para mim, no entanto, sempre que vá ao Calvário hei-de lá ver o Sobreiro com as suas folhas verdes a (re)nascer, como acontecia todas as primaveras.
Maria

Arouca - Porto - Norte / Norte - Porto - Arouca

A identidade de um território apura-se a partir dos seus elementos físicos, naturais, humanos e sociais, bem como na interacção dinâmica que ocorre entre esses elementos. Ao considerarmos o território de Arouca e os elementos da sua identidade autóctone, conclui-se, facilmente, que Arouca está bem enquadrada em quase todas as suas divisões territoriais, menos numa: o distrito de Aveiro. Infelizmente.

Arouca devia pertencer ao distrito do Porto. Desde o início da nacionalidade de Portugal, Arouca pertenceu, com todo o acerto, à Região do Entre-Douro-e-Minho e à Região Norte, que tinham, como cidade principal, a cidade do Porto. Também pertenceu à província do Douro Litoral, que talvez seja a divisão territorial mais adequada para o território mais vasto onde Arouca se insere e que constitui quase a totalidade do distrito do Porto, que tinha, como cidade principal, a cidade do Porto. Mas, por paradoxo, desde 1835, Arouca foi inserida, de modo errado, no distrito de Aveiro, à semelhança daquilo que aconteceu com outros municípios que nada têm que ver com Aveiro, como Santa Maria da Feira ou Espinho, para darmos mais dois exemplos!... Esta é, de facto, uma grave lacuna, em termos administrativos, do concelho de Arouca, já que o espaço urbano principal de referência de Arouca e dos Arouquenses sempre foi a cidade do Porto/Grande Porto, não apenas pelo facto de estar próximo, mas pelo facto do território identitário de Arouca se inserir nas divisões territoriais identitárias mais vastas protagonizadas pelo Porto e pela Região Norte.
Área da província do Douro Litoral
Assim, Arouca, de facto, nada tem que ver, nada mesmo tem que ver, com Aveiro. Nada. Por essa razão, Arouca pertence à Região Norte, enquanto Aveiro pertence à Região Centro. Por essa razão, Arouca pertence à Área Metropolitana do Porto, enquanto que Aveiro pertence à Comunidade Intermunicipal da Região de Aveiro. Por essa razão, Arouca pertenceu à província do Douro Litoral, enquanto que Aveiro pertenceu à província da Beira Litoral. Por essa razão, Arouca pertenceu ao Entre-Douro-e-Minho, enquanto que Aveiro pertenceu à Beira, no contexto da primeira divisão territorial do Estado português.

Numa altura em que Arouca vence a distinção nacional de ‘Município do Ano 2018’, bem como, pela segunda vez, vence na categoria regional da Área Metropolitana do Porto (área metropolitana que tem, como vice-presidente da direcção do Conselho Metropolitano, a actual presidente da câmara municipal de Arouca), é necessário que todos os Arouquenses, bem como as várias instituições públicas e privadas do concelho de Arouca, congreguem esforços permanentes para reforçar, cada vez mais, de modo adequado, em termos administrativos e identitários, esse «espaço natural de sempre de Arouca e dos Arouquenses», com o vínculo e o reforço das instituições de Arouca às instituições de âmbito mais geral protagonizadas pelo Porto e pela Região Norte. A Área Metropolitana do Porto é a principal porta de entrada, via terrestre, via ferroviária, via aérea, via marítima e via fluvial, de acesso ao concelho de Arouca, que se localiza em plena Bacia Hidrográfica do rio Douro. Esse enquadramento deve ser muito vincado, para que, quer os residentes quer as pessoas exógenas, fiquem bem conscientes da identidade territorial de sempre do concelho de Arouca, cujo território mais vasto é, como sempre foi, protagonizado pelo Porto e pela Região Norte.

Os bons elementos de uma identidade autóctone, como bem sabem os economistas e os sociólogos, são um meio poderoso de valorização económica de um território que, por sua vez, contribui para aumentar o bem-estar dos cidadãos residentes. 

«Defesa de Arouca»: Arouca e a sua Identidade

Foi com agrado que aceitei o convite, que me endereçaram, para colaborar neste blogue sobre Arouca, alicerçado a partir da estrutura identitária do jornal «Defesa de Arouca», semanário em relação ao qual, por razões óbvias, tenho uma ligação muito forte de afecto, visto que sou arouquense e sou neto e filho dos directores da sua IIª Série, bem como fui seu colaborador permanente, entre 1989 e 2008, durante cerca de 19 anos. Nasci, cresci e vivi com a «Defesa de Arouca» na minha querida Arouca natal.

Apesar de, no presente, já não ser publicado, o jornal «Defesa de Arouca» continua a ser um dos elementos identitários do concelho de Arouca, visto que constitui um acervo muito valioso e fidedigno que descreve a evolução histórica, durante décadas, de Arouca e dos Arouquenses, residentes ou espalhados pelo País e pelo Mundo, tendo promovido e dinamizado, de modo lúcido, os seus elementos identitários autóctones.

Penso que este blogue, no presente, deve, precisamente, em termos estruturais, contribuir para o reforço identitário dos bons e benévolos elementos autóctones do território de Arouca: os seus bons e benévolos elementos físicos, naturais, humanos e sociais, numa direcção em que o impulso e o impacto dos bons e benévolos elementos da configuração societal de Modernidade (e o padrão axiológico absoluto, para o apuramento e para a identificação desses bons e benévolos elementos, é constituído pelos valores morais noahides da Torá Hebraica de HaShem (Judaísmo Ortodoxo e Haredi Shomer Torá uMitzvot)) reforcem, cada vez mais, aquilo que Arouca tem de melhor, em termos endógenos, num território que deve ser cada vez mais próspero, ético, sadio e equilibrado, enquadrado no «espaço natural mais vasto de sempre» de Arouca e dos Arouquenses: a presente Área Metropolitana do Porto e a Região Norte, que têm, como capital, a cidade do Porto, que sempre foi a cidade principal de referência de Arouca e dos Arouquenses.

18 de novembro de 2018

A Serra da Freita em imagens: Policromia


Na Primavera já nos habituamos a ver as nossas serras exibirem um colorido peculiar. As flores  de carqueja, urze e tojo trazem ao planalto e encostas da Serra uma paleta de tons amarelo, rosa e violeta que lamentavelmente dura apenas algumas semanas.

Porventura o ponto alto deste acontecimento acontece mais próximo do final da Primavera, quando praticamente todos os arbustos estão em flor. A serra transforma-se num autêntico tapete policromático, com tons tão saturados que quase ferem os olhos.

Um dos locais onde melhor se pode apreciar este cenário é na “Garra” da Serra da Arada, uma encosta partilhada pelos concelhos de Arouca e São Pedro do Sul, retratada na imagem que aqui partilho.

P.S.: Espero que me perdoem o lapso - propositado - de incluir esta foto da Serra da Arada numa série chamada ”A Serra da Freita em imagens”, apenas com o propósito de manter a coerência de títulos nesta série de artigos sobre as nossas serras.

A outra "senhora"

O concelho de Arouca fica geograficamente situado numa zona mais ou menos equidistante a três capitais de distrito: Aveiro, Porto e Viseu.
Se geográfica, administrativa e historicamente o concelho de Arouca esteve e está arrolado ao distrito de Aveiro por outro lado e numa perspetiva de fluxos sociais, religiosos e comerciais o distrito do Porto é desde há muitas décadas a referência para os Arouquenses (excepção da zona mais a Este do concelho que em termos religiosos está arrolada à diocese de Lamego).
Viseu é uma capital de distrito que fica do "lado de lá" da Freita e a importância que tem para Arouca e os seus diferentes fluxos vêm-se esbatendo ao longo dos tempos.
São Pedro do Sul é um concelho limítrofe de Arouca pertencente ao concelho de Viseu. A via rodoviária que liga Arouca a São Pedro Sul foi, num passado não muito distante, assunto de várias acções e desenvolvimentos políticos. Outrora terá tido quase tanta importância como a "estrada" que nos ligaria ao litoral e que ansiosamente ainda hoje aguardámos. É curioso perceber que a importância desta via para os arouquenses acompanhou a realidade do país e a sua exacerbada "litoralização". Arouca, no que tem que ver com esta via, desempenhou medianamente o seu papel. Abriu-se, asfaltou-se e construiu-se uma nova via (com algumas novas pontes) que ligaram praticamente o centro urbano da vila ao limites do concelho na freguesia de Cabreiros. Esta obra, já do século passado, ficou parada e estagnada ali por aquela zona serrana durante vários anos. Há cerca de três anos o município vizinho melhorou um pouco as suas vias, nomeadamente, o troço que desce da aldeia da Coelheira para Santa Cruz da Trapa e mais recentemente um pequeno troço que permite evitar o afunilado centro da aldeia do Candal. 
Associado ao atrás descrito há um facto inegável: São Pedro do Sul possui um dos maiores complexos termais da Europa e o maior de Portugal. Todos os dias, ao longo de todo o ano, milhares de utentes das termas fazem os seus tratamentos termais matinais e são depois "orientados" e "aconselhados" pelas unidades hoteleiras a visitarem em excursões os territórios vizinhos. Viseu e Aveiro são os principais destinos destes milhares turistas. E porque não vêm estes turistas também até Arouca, que tão bem tem sabido capitalizar o seu turismo nos últimos anos? 
A resposta principal é uma: por causa da estrada! 
Primeiramente os autocarros não passavam no afunilado centro do Candal; ultrapassado este obstáculo, continuam a existir alguns desincentivos para que este desiderato se cumpra. O troço que liga o alto da Coelheira ao Candal passando pela Póvoa das Leiras continua a ser muito estreito, com mau piso e extremamente sinuoso, sendo mesmo perigoso para autocarros de turistas.
Poderíamos nesta altura pensar que isto são obras e responsabilidades da autarquia do concelho vizinho, mas nesta fase e com os últimos desenvolvimentos da rede rodoviária do concelho não deveria esta razão ser impeditiva para que se procurem estabelecer parcerias inter-concelhias neste âmbito.
Fica a reflexão e ficam por lá os milhares de turistas que poderíamos atrair para cá.

17 de novembro de 2018

Algumas notas a propósito do dia mundial dos pobres


    A Igreja Católica assinala amanhã, dia 18, o II Dia Mundial dos Pobres. A iniciativa de assinalar este dia foi lançada pela primeira vez pelo Papa no ano passado. A sua mensagem para este II Dia Mundial dos Pobres está publicada aqui.
    Há quem pergunte: como podem os membros da Hierarquia da Igreja falar de pobres, se vivem muitas vezes envolvidos em riquezas? Lembro-me de um membro do clero católico, uma vez interpelado sobre a riqueza e o esplendor (os luxos) do Vaticano e o porquê de se não venderem para se distribuir o produto pelos pobres, responder afirmando que a alma humana precisa desses luxos.
    Na edição da Defesa de Arouca de 16 de maio de 1936, na p. 3, há uma crónica da visita do bispo do Porto, D. António Augusto de Castro Meireles, a Mansores, nos dias 5 e 6 de maio desse ano. O correspondente remata a crónica dizendo que o bispo, ao despedir-se terminou por desejar a paz nos lares “onde nunca falte um caldinho quente a fumegar e um bocadinho de pão saboroso”. A linguagem é da época, não restam dúvidas.
    Sobre os pobres e a pobreza não sei falar. Como cristão, interpela-me a consciência ler nos atos dos apóstolos que “Eram assíduos ao ensino dos Apóstolos, à união fraterna, à fração do pão e às orações. (…) Todos os crentes viviam unidos e possuíam tudo em comum. Vendiam terras e outros bens e distribuíam o dinheiro por todos, de acordo com as necessidades de cada um.” Só vendo neste “vendiam terras e outros bens e distribuíam o dinheiro por todos” uma metáfora não me posso acusar.
    Lembro a reflexão de Margarida Rocha “Pobreza em Arouca - Sim ou Não?”, pulicada neste blogue no passado dia 17 de outubro, precisamente há um mês, na ocasião em que se assinalou o Dia Internacional para a Erradicação da Pobreza.

O Sobreiro do Calvário

Numa das suas visitas ao nosso concelho, dizia José Hermano Saraiva, no programa “Lendas e Narrativas”, “que é muito possível que o mais antigo altar de Arouca não seja o da Rainha Santa Mafalda, seja apenas este imenso rochedo(…)” Referia-se, este historiador, ao Calvário, classificado como Monumento de Interesse Público, em 1948, pelo Decreto 37 077, DG, I série, nº 228, 29-09-1948.

Aludia ainda, este autor, que desde que as sociedades primitivas criaram os deuses, estes andaram intimamente ligados às pedras. Não seria de estranhar, portanto, que neste local, possivelmente se tivessem realizado as primeiras manifestações religiosas do vale de Arouca.

Numa visita ao site da Direção Geral do Património Cultural, obtém-se mais informação acerca deste local. Aqui se pode ler que “O Calvário de Arouca designa na realidade um conjunto de seis cruzeiros seiscentistas, em granito, erguidos num maciço rochoso a norte da vila, no cimo da antiga rua da arca. Junto das cruzes estão ainda implantados um púlpito em granito, e um nicho. O conjunto é completado por três outros cruzeiros, de factura semelhante, dispersos por vários arruamentos, compondo uma Via Sacra que incluis o vizinho Mosteiro e terminava aqui. Os cruzeiros são compostos por altos pedestais quadrangulares, sobre os quais se elevam pilastras encimadas por capitéis de secção quadrada, suportando singelas cruzes latinas, em granito. O curioso púlpito, de não menos invulgar implantação, é cilíndrico, assentando numa base cilíndrica mais estreita, por sua vez levantada sobre uma plataforma quadrangular. O acesso faz-se através de uma pequena escadaria com cinco degraus. O nicho, ou alminha, possui vão de arco redondo, e é rematado por uma pequena cruz. Todos os elementos se distribuem pelo terreno naturalmente árido e acidentado de forma aparentemente desordenada. O Calvário e a Via Sacra foram erguidos pela Confraria do Senhor dos Passos, instituída na Igreja (hoje capela) da Misericórdia de Arouca em 1621. Esta irmandade organizava, desde 1626, a procissão da mesma invocação, que partia do referido templo durante as celebrações da Quaresma, terminando na Capela do Espírito Santo, Junto do Calvário. O cruzeiro central (restaurado) possui a data de 1627 inscrita no pedestal, estando o púlpito, por sua vez, datado de 1643. A procissão saiu nos mesmos moldes até 1855, ano em que se passou a chamar de procissão do Senhor Morto. Ainda hoje se efectua este cortejo, também conhecido por procissão dos Fogaréus na quinta-feira Santa. As restantes cruzes da Via Sacra encontram-se junto ao Mosteiro de Arouca, na Rua de Santo António, e na via de acesso ao Calvário, junto a uma casa senhorial. Não se encontram incluídas na classificação, embora façam parte do mesmo conjunto monumental.”

Algo que José Hermano Saraiva e a Direcção Geral do Património Cultural não referenciaram, foi o sobreiro que ali nasceu e cresceu ao longo de décadas. É natural. Para eles, a história de Arouca são factos. Para nós, são emoções.

O Sobreiro do Calvário que serviu de torre de vigia, de base militar, de avião, de nave espacial, que deu aconchego e sombra aos primeiros beijos de adolescentes enamorados, só poderia ser significativo para aqueles que ali passaram grande parte da sua infância e partilharam, com este amigo, muitos dos seus momentos de vida. Um amigo que acolheu tantas conversas solitárias, tantos desabafos, tantos segredos, e que sempre os soube guardar. Um amigo para a vida.

Infelizmente, aqueles que outrora o abraçavam e visitavam, foram envelhecendo e saindo dali. Deixaram de lhe falar e, da Rua D'arca, quase nem o olhavam. A vida de adulto é tão complicada. É tão apressada. Não há tempo para nada. Nem para olhar os amigos que estão onde sempre os encontramos.

O sobreiro foi envelhecendo e, na sua solidão, perdeu a cor de esperança com que nos abraçava na infância. Foi envelhecendo e, na sua solidão, perdendo a sombra com que nos protegia. Envelheceu sem querer incomodar. O seu trabalho estava feito. Sentia-se feliz por nos ver passar, sempre tão apressados, na rua que também era sua. Que belos adultos estávamos.

O sobreiro já não está lá. Ficam as memórias de cada um que ali brincou, namorou e desabafou.

Que se aproveite este momento para recuperar o imóvel classificado, um pouco gasto, e dar-lhe a dignidade que a sua história merece.

16 de novembro de 2018

Se necessário, para que dê à luz, viole-se a moça!

Não passam muitos meses, completaram-se oitenta anos sobre a chegada da energia eléctrica a Arouca. Ou melhor: às principais ruas da vila e de algumas freguesias próximas. Pois a maior parte do concelho permaneceu na escuridão ainda por muitos anos, para beneficio do imaginário popular e sobrevivência das criaturas que habitavam a penumbra e as trevas.

Em 1933, Arouca e Castelo de Paiva eram já os únicos concelhos do distrito de Aveiro a que não tinha chegado ainda a energia eléctrica. Então, apesar de não andar já muito distante, conduzi-la até a Arouca mostrava-se ainda mais dispendioso do que - pensava a Câmara da altura - solucionar o problema a nível local. Pensou-se então em duas soluções: uma, termoeléctrica, por via da utilização de uma das serrações existentes no concelho, onde, a óleo ou através da queima de combustíveis pobres, se accionasse um alternador que alimentasse as redes de distribuição; a outra, hidroeléctrica, mais elaborada e arrojada, por via do aproveitamento da queda de água da Mizarela, lá no alto da Freita.

Frecha da Mizarela
É verdade! Aquela que é hoje uma das mais conhecidas e imaculadas belezas naturais do concelho de Arouca, da região e até do país, algumas vezes cobiçada até por outro concelho vizinho, poderia mostrar-se hoje - depois de nos ter dado a luz - irremediavelmente violada, esventrada e destroçada.

«A natureza, que foi pródiga na formação da queda, não o foi menos no fornecimento dos meios necessários para a sua valorização pela facilidade que há de se fazer um embalse em condições particularmente económicas. É de facto possível, construindo uma barragem de pequeno volume e 8 metros de altura no sítio denominado Largo de Porto Pereiro, armazenar a totalidade da água que caia na bacia hidrográfica a montante desta barragem. Os terrenos alagados são todos baldios.» «A barragem terá em planta a forma de um arco de círculo de 52 metros de raio, terá 2,5 metros de altura e 22 metros de comprimento.», refere o estudo então realizado.

Uma das várias peças do projecto
Senhor nos perdoe, tê-lo pensado sequer! Deu-se à luz sem ser necessário deslustrar a moça. A mais bela das nossas moças, por sinal.

Mas, ao contrário do que se possa pensar, não foi nenhuma candeia mais acesa nos Paços do Concelho a iluminar as mentes que projectaram tal desconsideração. A ideia era mesmo para concretizar! Tanto mais quando, pouco diferentes deste, eram os projectos de aproveitamento das águas do rio Paiva, na Espiunca e em Varzielas, igualmente para produção de energia eléctrica, já autorizados ao Conde de Castelo de Paiva.

Porém, - vá-se lá saber por preces e apelos de quem -, caducaram as concessões outorgadas ao Conde de Castelo de Paiva e foi entretanto demitido o Presidente da Comissão Administrativa da Câmara Municipal de Arouca. Este, demitido por uma outra razão, é certo, mas que veio mesmo a calhar relativamente a esta outra questão.

O novo Presidente tratou então de incluir Arouca nos concelhos a abranger pela ampliação da concessão de distribuição de energia em alta tensão. Meio ano depois, foi assinado o contrato de fornecimento entre a Câmara Municipal e a Eléctrica Duriense. Em 1937 foram regulamentadas as condições de fornecimento de energia para consumo de particulares e, em 1938, foi finalmente inaugurada a energia eléctrica nas principais ruas da vila e de algumas freguesias próximas. Moldes e Tropeço só viram a luz já nos anos cinquenta, assim como, mais tardiamente, Mansores, Escariz, Fermedo e São Miguel do Mato.

O facto é que, para além da sede do concelho, as restantes localidades só se veriam iluminadas conforme o lucro líquido o fosse permitindo e, para além disso, se se mobilizassem, no mínimo, vinte cinco consumidores da zona a electrificar, os quais teriam de contribuir antecipadamente com a quantia avaliada como necessária para fazer face aos encargos com o estabelecimento da rede.

Nem tudo foi reluzente e andou à velocidade da dita, como é óbvio. Mas também não era preciso abusar!... Por força das voltas que a coisa deu e da substituição da desconsideração das maravilhas com que a natureza nos contemplou pelos custos empreendidos nos bolsos dos consumidores, lá, nos lugares da serra, donde a luz era para ter vindo, só foram as pessoas socorridas das trevas nocturnas volvidos mais de quarenta anos, pelo Natal de 1980.