Nascemos, crescemos, vivemos, morremos. Somos esquecidos. Por vezes somos lembrados. Permitam-me que evoque o Pe. Manuel António Fernandes (1881-1968), pároco que serviu em Mansores por 60 anos e foi um autêntico exemplo do “cura de aldeia” de outros tempos.
Manuel António Fernandes nasceu a 7 de abril de 1881 no lugar de Merlães, freguesia de Cepelos, concelho de Cambra. Filho de Manuel Fernandes e de Maria Custódia de Pinho, lavradores. Aos 16 anos entrou para o seminário na diocese do Porto, onde prosseguiu estudos e foi ordenado presbítero a 31 de julho de 1904, às mãos de D. António Barroso, o reconhecido bispo-missionário.
Foi pároco em Mansores desde 9 de fevereiro de 1905 até meados de outubro de 1965, quando faltava praticamente um mês para o encerramento do segundo Concílio do Vaticano. Assumiu o ofício de pároco em Mansores com 23 anos e transmitiu-o com 84. Foram 60 anos completos e ininterruptos ao serviço da freguesia. É obra e não é comum. Quantas centenas de fiéis, quantas gerações de paroquianos batizou, levou à comunhão, casou, sepultou?
Nos primeiros cinco anos e meio de pároco acumulou a função de Presidente da Junta, como era de lei. Poucos meses após ter assumido a presidência da Junta conseguia esta receber do Estado aquela que foi a sua primeira “casa das sessões”. Até então a Junta não tinha uma sede própria e permanente.
Durante o período conturbado da Primeira República, sendo ainda jovem, resistiu com firmeza a diversas ameaças e ataques lançados sobre si; há registos de ter explodido uma bomba à porta da sua residência, onde, noutra ocasião, foi deixado um alguidar e uma faca, em ameaça de morte. Há memória de ter sido perseguido, tendo de se refugiar na torre da igreja. Também nesse período rejeitou a proposta de “pensão eclesiástica” oferecida pelo governo republicano e foi um acérrimo opositor à venda do Passal e da Residência.
Embora não assinando, subentende-se que foi o correspondente em Mansores da Defesa de Arouca nos primeiros anos deste periódico. Cá estamos nós a tropeçar de novo na Defesa de Arouca.
Faleceu a 24 de novembro de 1968 na Residência paroquial de Mansores, casa onde viveu 63 anos. Foi o último habitante dessa secular residência, destruída em 1999 para no local se edificar o chamado salão paroquial. Se da residência, demolida há quase duas décadas, já é vaga a memória, quanto mais do seu derradeiro habitante, desaparecido de entre nós faz 50 anos no próximo dia 24.
Viveu para a comunidade e morreu pobre. Deixou aos seus o que os seus lhe deixaram. Deixou rastos documentais, deixou muitas memórias. Memórias que urge avivar, registar, antes que se extingam definitivamente.