23 de outubro de 2021

As estórias da história do Festival da Castanha

O festival da castanha está de volta agora que a pandemia parece querer dar tréguas. A autarquia já anunciou que, ainda que não nos moldes habituais, irá realizar um conjunto de actividades para marcar o regresso deste evento âncora  cada vez com mais protagonismo na agenda cultural do concelho. Sendo esta a sua 10ª Edição ( ou a 9ª caso saltemos o ano de 2020 onde não decorreu) seria interessante recordar como tudo começou. 

Antes de 2011 ( sua primeira edição) já por várias vezes tinha pensado que existia um evento que marcava a transição de uma Arouca culturalmente rica e cheia de actividade  para uma espécie de hibernação cultural que durava até épocas do Natal. A feira das Colheitas o maior evento do concelho marcava esta transição. Frequentava à data alguns festivais de músicas do mundo e ligados às raízes tradicionais e culturais das  gentes ( Andanças, Byonrtimos, Trebilhadouro, etc....) que decorriam também invariavelmente no Verão. Posto isto e no rescaldo de umas colheitas falei com dois amigos, Joaquim Alves ( Quim Albano) músico bastante ligado a este tipo de eventos e o Nuno Costa ( Picasso) empresário do sector da restauração para nos juntarmos e organizarmos algo semelhante neste hiato temporal e cultural em Arouca, fora da agenda da maioria dos eventos nacionais e tendo como tema a castanha. Arouca era e é reconhecida pela terra da castanha e não tínha um único evento cultural/gastronómico que o assinalasse. E assim começou. Reunimos com a autarquia e apresentamos o nosso projecto. Desde de uma primeira reunião verificamos que seria necessário uma pareceria associativa para obtermos o apoio do município. Convidamos então umas das mais antigas associações do concelho e também ligada à música folclore: a Casa do Povo de Arouca. Convidamos alguns grupos musicais que por ligações de amizade "facilitaram" e aceitaram o nosso convite.  Os dois primeiros grupos actuarem no festival da Castanha foram: o grupo de musica popular da região de Coimbra Fonte na Pipa e o grupo de músicas do mundo da região do Douro Andarilhos. Da parte da autarquia conseguimos que autorizassem o uso do pátio interior do convento e montassem uma tenda, que na altura pedimos que fosse transparente, onde decorreria o festival. Com a casa do Povo organizamos alguns workshops de danças tradicionais e montamos um restaurante dentro da sala dos arcos que serviria de apoio ao mesmo e onde a castanha seria rainha. Arriscamos e decidimos que a entrada seria paga, ainda que de valor simbólico, algo que não era comum em Arouca. O objectivo era que o festival fosse sustentável por si e que as entradas suportassem o custo do mesmo. O festival foi um sucesso e exatamente aquilo que idealizamos. O segundo ano, 2012, repetimos a receita mas desta vez já com uma maior participação/suporte económico por parte da autarquia. O festival passou a ser de entrada de gratuita. 


I Festival da castanha

Em 2013 e na sua terceira edição os três ideólogos do festival "saem de cena" e deixam a Casa  Povo de Arouca e município de Arouca como organizadores do evento. O resto é história conhecida. 

Este ano está aí mais uma vez o festival da castanha um evento que partiu da sociedade e que o município aproveitou e transformou num dos marcos culturais anuais do concelho.

17 de outubro de 2021

Prof. Fernando Miranda (1936-2021)

Faleceu, na passada quinta-feira, 14 de Outubro de 2021 (da era comum), na sua residência de São Mamede de Infesta (Matosinhos), aos 85 anos de idade, o prof. Fernando Miranda. Um arouquense ilustre que muito diz a Arouca e aos Arouquenses, visto que, para além de outras inúmeras boas razões, é a personalidade estrutural que configurou o Conjunto Etnográfico de Moldes de Danças e Corais Arouquenses, que é o grupo de música tradicional de Arouca com maior relevância e uma das associações mais representativas do município. 
Fernando Alves de Almeida Miranda nasceu a 29 de Junho de 1936, no lugar do Bairro, freguesia de Moldes, concelho de Arouca. Era filho do Dr. Ângelo Pereira de Miranda (insigne médico transmontano radicado em Arouca) e de Aurora Alves de Almeida (do lugar do Bairro).
Depois dos estudos iniciais em Arouca, frequentou a Escola do Magistério Primário do Porto, onde se formou em professor primário, tendo, depois, leccionado na Escola Primária de Tropêço (Arouca) e na Escola Primária do Seixo (São Mamede de Infesta).
Casou-se com a colega de profissão, natural do município de Matosinhos, prof.ª Maria do Carmo da Silva de Almeida Miranda, com quem teve duas filhas (Maria do Carmo e Ângela Maria) e um filho (Ângelo Fernando), dos quais deixa ainda dois netos e duas netas. 
Viveu, de modo permanente, com a sua família próxima, entre a sua residência de São Mamede de Infesta (Matosinhos) e a sua casa natal e familiar do lugar do Bairro, na freguesia de Moldes (Arouca), que eram o seu território endógeno de afecto e de enraízamento.
Muito ligado à área da Música, tendo feito parte da Banda Musical de Arouca, contudo, o seu maior e mais notável contributo, em Arouca, relaciona-se com as danças e os corais tradicionais de Arouca: com apenas 18 anos, o prof. Miranda assumiu a direcção do então Rancho de Moldes em 1954, cerca de uma década após a sua fundação ocorrida na Feira das Colheitas, tendo exercido, até 1977, as funções de director artístico e de presidente da direcção do grupo. Ele está na origem, com o etnógrafo Albano Ferreira e com o maestro Vergílio Pereira, da estruturação etnomusicológica de qualidade do actual Conjunto Etnográfico de Moldes de Danças e Corais Arouquenses, que teve «os seus anos de ouro», precisamente, nas décadas de cinquenta e sessenta do século XX. Mesmo depois de ter saído da direcção do grupo em 1978, sempre esteve muito ligado, com a sua família próxima, às actividades do grupo, tendo sido, ao longo dos anos, presidente da Assembleia Geral, até à altura em que foi substituído, nessa tarefa, pela sua filha mais velha Maria do Carmo.
A sua ligação às instituições de Arouca não se limitou à 'Banda de Arouca' ou ao 'Rancho de Moldes', uma vez que também foi um dos fundadores e dinamizadores do Centro Cultural e Recreativo de Moldes, nas suas décadas iniciais.
O prof. Miranda também era poeta, escrevia poesia, que é uma faceta que lhe era menos conhecida.
Verdadeiro democrata e com forte sentido cívico, de justiça social e de liberdade, tendo herdado os valores políticos republicanos e democratas de seu pai, o prof. Miranda era militante do Partido Socialista desde o ano de 1974, tendo desempenhado diversos cargos políticos e partidários, com funções de dirigente local, distrital e nacional do PS: foi deputado, pelo Círculo Eleitoral do Porto, à Assembleia da República, na I Legislatura, resultante das eleições legislativas de 25 de abril de 1976. Em Matosinhos, desempenhou, pelo PS, durante dois mandatos, as funções de vice-presidente e de vereador do executivo municipal, entre 1982 e 1989, então presidido por Narciso Miranda. Também foi membro da Assembleia Municipal de Matosinhos e membro dos vários órgãos da Secção do PS de São Mamede de Infesta. Ocupou também um cargo de direcção do F.A.O.J. .

Pessoa de muito prestígio e muito respeitada, sobretudo em Arouca e em Matosinhos, bastante conhecido na área do Grande Porto, foi, nos últimos anos, homenageado pelo Conjunto Etnográfico de Moldes e pelas estruturas locais do Partido Socialista de Matosinhos. 
Apesar da sua ligação e do seu reconhecimento em Matosinhos, o seu maior afecto prendia-se com a sua Arouca natal, em particular com o seu espaço natal e familiar do lugar do Bairro, em Moldes. Como seu verdadeiro amigo e vizinho em Moldes (eu convivi, durante anos, com o prof. Miranda e com a sua família próxima...), posso relatar que não havia, praticamente, nenhum fim-de-semana que o meu estimado amigo prof. Miranda não passasse, em Arouca, na sua casa do lugar do Bairro, com a família próxima. Era tal o afecto que ele tinha por Arouca e o interesse por tudo o que dizia respeito a Arouca e aos Arouquenses, com o anseio de que Arouca evoluísse sempre bem.
Este resumo, como é óbvio, não dá conta, totalmente, da excelência singular de um ser humano e de um arouquense a quem Arouca e os Arouquenses muito reconhecem, pelo que, entre outras inúmeras boas razões, mas sobretudo devido à acção que o prof. Miranda teve na estruturação e na dinamização do Conjunto Etnográfico de Moldes de Danças e Corais Arouquenses, transformando-o num grupo de prestígio nacional, faria todo o sentido que a Câmara Municipal de Arouca atribuísse, no futuro próximo, como homenagem mais que merecida, o nome do prof. Fernando Miranda (1936-2021) a uma rua da Vila de Arouca.

Em nome deste blogue «Defesa de Arouca» (e o prof. Miranda também chegou a escrever na «Defesa»), endereço, à família do prof. Fernando Miranda, as mais sentidas condolências.

Em termos pessoais, para mim, faleceu (apenas fisicamente) um verdadeiro amigo, um amigo de família e «um pai». Um ser humano e um arouquense de excelência ética e cívica que eu muito admirava e admiro, com quem muito convivi e de quem era muito amigo...Não tenho mais palavras para esta altura de consternação...

10 de outubro de 2021

Querido, Padre Vilar!


Todos nós que tivemos o privilégio de partilhar a nossa existência com ele, nos sentimos hoje empobrecidos pela sua partida. Todos nós que vivenciamos a sua alegria transbordante, abafamos, hoje, a nossa lágrima de tristeza pela notícia que chegou de modo inesperado… exactamente, porque há pessoas que sempre serão eternas, no nosso coração finitamente humano.

Todos nós que nos sentimos afortunados pela sua presença, num ou noutro momento da nossa vida, temos estórias deliciosas que hoje, mais do que nunca, nos envolvem a memória e nos toldam a emoção.

São precisamente duas dessas estórias que hoje venho partilhar convosco!

Se a vida é o tempo que medeia entre o nascimento e a morte, foi precisamente num momento de nascimento e de outro… de morte que o padre Vilar esteve mais ao meu lado... de forma generosa e comprometida com a excelência do humano.

1995 – Eu tinha (quase) 37 anos e estava grávida do terceiro filho. Na época, reinava um pouco a ideia de que, a partir dos trinta e cinco anos, as mulheres tinham grande possibilidade de ter um filho com problemas de mongolismo que poderia ser detectado com um exame - a amniocentese - que requeria, da minha parte, uma decisão nada fácil.
Um dia, na sala de professores, chamei-o a um canto e disse-lhe que tinha ali “um papel” para fazer o referido exame e o que é que ele achava. Ele, sem hesitar, olhou-me e disse:
- “Rosa a decisão é tua… mas tu tens naquela escola (referia-se ao ciclo preparatório) a tua filha Diana (então com 11 anos) e se ela tiver um acidente ao atravessar a estrada e ficar “deficiente”… tu não vais continuar com ela? Os filhos não se devolvem… Acrescentou que conhecera um casal jovem com um miúdo com essa “diferença” e que continuavam os três a ser muito felizes…
Olhei-o e compreendemo-nos num apertar de mãos que, sem lhe dizer, muito serenou a minha preocupação de mãe…
Chegada a casa, partilhei a conversa tida com o Padre Vilar com a minha filha Diana, que sabia há alguns dias, da minha preocupação e do desafio que seria para nós ter um menino “assim”. Ali, mesmo, na sua presença, sem destruir a preocupação, rasguei, definitivamente, o papel…
No dia do nascimento, e quando a minha filha viu o menino, virou-se para mim e disse:
- Oh, mãe, mais perfeitinho não podia ser…

*  *  *

2007 – São cerca de cinco horas de uma tarde soalheira, mas demasiadamente cinzenta. A minha filha Diana (com 22 anos) acabara de falecer… e o Padre Vilar entrava no quarto dela acompanhado de alguém da família que já não lembro o nome.
Atónito, olhou-me e disse:
- Porque é que não me disseste, eu não sabia de nada…
Alguém presente lhe explicou que tudo se passara num mês… que foi tudo demasiado rápido…
Olhei-o, de novo e pedi-lhe:
-Por favor, quero-o a rezar-lhe a missa do funeral… ela sempre gostou muito de si, desde que o conhecera como aluna!
A seguir, eu que num esforço pedagógico de muitos anos, sistematicamente, lanço questões desafiantes aos meus alunos - e, como que estivéssemos ali os três sozinhos - pedi-lhe um bocadinho de conforto numa das questões mais profunda e dolorosamente sentidas que alguma vez pensara colocar ao longo da minha vida:
- PORQUÊ, Padre Vilar?
- Olha, Rosa, Deus precisa lá dos bons…
Eu, que sempre, oscilei entre os domínios (segundo alguns, incompatíveis) da razão e da fé, senti naquelas palavras uma tamanha serenidade que ainda hoje estas me envolvem e continuam a contribuir para que seja uma mulher feliz.
Sim, porque só poderia ser essa a razão e mais nenhuma…

Por tudo isto, e pelos bons momentos que passamos juntos na escola onde recordo uma pessoa alegremente desconcertante e com um sentido de justiça muito apurado, o Padre Vilar, também em mim, deixou uma saudade estranhamente abraçada a uma quietude que permanece desde os muitos momentos de excelência que tão bem soube partilhar com todos nós.

Outono de sol!
Um dia cinzento de dor…O Padre Vilar, partiu para o céu…
PORQUÊ?
-“Porque Deus precisa lá dos bons…”

Até um dia, querido Padre Vilar!

Rosa Sousa

8 de outubro de 2021

Padre Américo Brandão Pereira Vilar (1938-2021)

Foi com pesada consternação que recebemos hoje a notícia de falecimento do Padre Américo Vilar (foto: André Teixeira). Natural da freguesia de Santa Eulália, onde nasceu em 04 de Junho de 1938, tendo sido ordenado sacerdote em 04 de Agosto de 1963, o Padre Américo Vilar, há algum tempo aos cuidados da Santa Casa da Misericórdia de Arouca, foi uma personalidade relevante e incontornável da sociedade Arouquense nos últimos largos anos.

Para além do múnus sacerdotal, a que se dedicou sempre com empenho, e também das funções de professor, que desempenhou sempre com dedicação, o Padre Américo Vilar, fazendo uso do lema "ninguém é Padre para si mesmo, mas para os outros", para além de um cidadão disponível e afetuoso, foi um empreendedor e interveniente ativo na vida social, associativa e institucional do concelho, tendo estado associado à fundação de várias associações e entidades relevantes, nas quais desempenhou diversos cargos e funções, bem como ao lançamento e edificação de várias e importantes obras, nomeadamente, de cariz religioso, humanitário e social.

Endereçamos as nossas condolências à família e curvamo-nos saudosa e respeitosamente perante a sua memória.

Paulo Teixeira

António Brandão de Pinho

2 de outubro de 2021

A vingança e defesa das gentes de Arouca

Na introdução ao meu trabalho "O Último Capitão de Ordenanças e Milícias de Arouca", refiro que: «a história das Invasões Napoleónicas e/ou das Lutas Liberais está mais do que estudada e sistematizada. E a transição do Antigo Regime para o Liberalismo também. No entanto, como se verificará, não estão estudados muitos dos factos e acontecimentos locais de Arouca nem evidenciados alguns dos seus protagonistas, que se relacionam com essa história. É verdade que sem relevância para a história nacional, mas com muita importância para a nossa história local.»

Um desses factos e acontecimentos, que não abordo na versão preliminar daquele estudo, mas que aqui conto por aditamento, é o que se retira de um assento de óbito lavrado nos livros da paróquia de São Bartolomeu de Arouca, que transcrevo integralmente: «Aos trinta do mês de Março do anno de mil oito centos e nove, prezo pelo povo, e depois confefsado e excommungado hum homem que unanimemente se dizia ser o Capitão mor José d'Oliveira Camossa da Terra da Feira, foi pelo mesmo povo afsafsinado por dizerem que era traidor à Pátria, e para que a todo o tempo constafse fiz este afsento. Foi enterrado no adro desta Igreja aos trinta e hum do mesmo. Era ut supra. O Pároco José Vicente Carneiro de Vasconcelos Nobre.»

Este inusitado e surpreendente acontecimento assume ainda maior relevo se o contextualizarmos e percebermos o que levou a população de Arouca a fazer justiça pelas próprias mãos, sob a grave acusação de traição à Pátria. O contexto é o das Invasões Napoleónicas, mais especificamente o da Segunda Invasão, liderada pelo marechal Soult, que virá a ocasionar o célebre desastre da Ponte das Barcas, que unia as margens do Porto e Vila Nova de Gaia, ocorrido em 29 de Março de 1809, levando à morte por cruel afogamento de mais de quatro mil pessoas, militares e civis. 

Nesse dia, para sempre recordado como de perpetuo luto e horror, encontrava-se na cidade do Porto, entre muitos outros militares e civis, inclusive de Arouca, José de Oliveira Camossa, comandando as milícias e ordenanças de Oliveira de Azeméis, quando, inesperadamente, ali entraram as forças comandadas pelo marechal Soult, desencadeando o alvoroço que, para além doutras atrocidades, viria a provocar aquela tragédia. Facto a que não foi alheia a retirada atabalhoada e cobarde de muitas milícias e ordenanças, entre as quais as comandadas por Camossa, que se retirou pela margem esquerda do rio, deixando que os seus homens fugissem em debandada para suas casas.

Camossa só terá olhado para trás já na descida da Farrapa para o vale de Arouca, para onde fugiu e chegou no dia seguinte, com o fito de se alojar em casa de um individuo que reputava seu amigo, mas que, percebendo o sucedido, logo o denunciou como traidor ao povo revoltado e solidário com os seus filhos e conterrâneos ainda por parte incerta, quem sabe a sucumbir nas águas do Douro, pelo que foi imediata e impiedosamente assassinado.

João de Oliveira Camossa, para além de capitão-mor de Oliveira de Azeméis, que em seu favor se separou da capitania-mor da Feira, era Fidalgo da Casa Real e Cavaleiro da Ordem de Cristo, e avô materno de Manuel Baptista Camossa Nunes Saldanha, natural da Casa da Terça, de Mansores, que veio a ser, entre outros cargos, presidente da Câmara e Administrador do Concelho de Arouca durante vários anos, agraciado com título de Visconde de Albergaria de Souto Redondo pelo rei D. Carlos I.

*  *  *

As milícias e ordenanças de Arouca ter-se-ão esforçado e demorado um pouco mais, mas não sem sofrer as consequências desse esforço. Com efeito, ficaram acometidos de consideráveis incapacidades os próprios capitão-mor Manuel José de Almeida Ferraz Bravo e sargento-mor José de Bessa Brandão, a tal ponto de, para se estabelecer a rápida defesa de Arouca, sempre cobiçada pelas riquezas do seu Mosteiro, mas agora também exposta a represálias, logo a 5 de Abril se tivesse ordenado a António Gomes do Vale Quaresma, capitão de uma das companhias locais, que daí em diante lhe fosse tudo responsável, visto que os lideres atuais, pelas suas moléstias, não se encontravam mais em estado de bem servir.

Poucos dias depois, ordena-se também ao capitão da companhia de Malta, Manuel Joaquim de Sousa Brandão, que, com oito homens de espingardas ou dez com um cabo, sigam para a ponte de Telhe e aí coloquem uma barreira que possa abrir e fechar sempre que necessário, com a promessa de serem rendidos de vinte e quatro em vinte quatro horas.

A 19 de Abril, o brigadeiro inglês Robert Wilson é encarregado de comandar a vanguarda do exército português e, nomeadamente, vigiar os caminhos que passam por Arouca em direção ao Porto e Entre-os-Rios, dispondo de três batalhões de caçadores, com duas companhias do regimento britânico, formando tudo uma brigada ligeira. As suas avançadas colocaram-se na Farrapa, ponto vantajosamente situado na cumeada divisória entre as águas do Douro e do Vouga, a meia distância entre Arouca e Oliveira de Azeméis, e donde era fácil comunicar pela sua esquerda com as tropas do coronel Trant, que vigiava a linha do Vouga.

No dia 28 de Abril, Wilson encarrega o major Luís Paulino Pinto da França «...da defesa da vila de Arouca e sua linha, de reconhecer e proteger todos os caminhos e avenidas para a dita vila e desta e das estradas de Lamego para o Porto, e pela vizinhança da margem do Douro e, finalmente, de fazer o que for conveniente para o bem do serviço e operações militares deste exército, para o que as ordenanças, autoridades militares e civis lhe prestarão os devidos e requeridos serviços. De todas as suas operações deve a dita vila esperar a sua segurança, que eu apoiarei e socorrerei com a competente tropa quando seja necessário e recomendo àqueles povos que, com fidelidade ao seu Soberano e amor à sua independência resistam, como honrados portugueses ao jugo de um tirano e ao ultraje da sua religião.»

Por sua vez, estando já as forças inimigas muito próximas dos limites do concelho e devidamente posicionadas, a certa altura Soult manda avançar um contingente sobre Arouca, quiçá para vingar alguma morte de que lhes chegara notícia ou para, muito simplesmente, saquear o Mosteiro e obter não só objetos de valor mas também víveres para os seus homens e animais. Porém, o major Pinto da França aguardava-os já nas gargantas e trincheiras da Farrapa, onde os enfrentou com grande coragem, obrigando-os a retroceder para trás da defesa organizada desde os pendores de Rossas até à ponte do Carvalhal, onde as tropas francesas, durante nove dias, tentaram a incursão em Arouca, mas sem nunca conseguirem avançar, até que, por fim, desmoralizadas, acabaram por desistir.

A Segunda Invasão Napoleónica teve o seu fim após a Segunda Batalha do Porto, travada a 12 de Maio de 1809, que ditou a retirada das tropas francesas do Norte de Portugal.