História que pode ser verdade...Terras mágicas.
“Aqui por Leirosa encontrei finalmente o que sempre procurei, gente boa, terra boa, um ar tão limpo
que até me lavou os desgostos. Não tenho nada mas sou feliz com isto”.
Via o chegar sempre aos domingos à tardinha. Muito
devagarinho abria o portão com aquela
intimidade de quem conhece os
sítios, e sem ruído, sem olhar, parecia que os seus passos só conheciam aquele
banco de pedra debaixo da enorme japoneira. Sentava se, e afastava com aquelas mãos pequenas e sujas com
o pó de muitas canseiras, aquele tapete de flores que a árvore, como se
adivinhasse a sua chegada sempre espalhava naquele dia. Tinha mais uma vez à
sua espera aquele enorme tapete de cores avermelhadas. Remexia o velho e sujo saco que lhe servia de
companhia e mala de viagem, às vezes encontrava o que procurava, outras vezes
nem sei, e lá ficava a aguardar que a noite não faltasse àquele encontro que
marcara há muito tempo atrás e se transformara numa rotina permanente. De
domingo à noite até segunda de tarde a sua casa, o seu conforto, a sua família
eram aquelas coisas que o rodeavam e nunca o tinham abandonado, substituindo
sei lá amigos de que já não se lembrava.
Ah, esquecia me, preparava o banco de pedra com uma manta decorada com enormes
buracos e colocava-se sempre de maneira que pudesse ficar a ver o pequeno vale
de Lourosa de Campos, mas ao mesmo tempo, o brilho das muitas estrelas que mal
vinha a noite, por lá passavam num desfile de brilhos e segredos que talvez só
ele conseguia descobrir. Na manhã seguinte por muito cedo que fosse estava
sempre sentado no banco a olhar na mesma direção como se não conseguisse soltar
o olhar do que tanto o encantava. Tinha uns olhos muito pequeninos ou fazia por
nunca os abrir na totalidade, via no entanto os dias e noites partir sempre com
a mesma expressão de quem é feliz. Qualquer comida ou bebida lhe abraçava os pensamentos e dava forças para
repetir as visitas, sem incómodos, sem conversas, sem explicações. Diziam por
lá os mais antigos que tinha sido um desgosto de amor a causa de tal modo de
vida. Que mais poderia ser penso eu agora, foi de certeza. “Que veio de longe,
subiu e desceu montes e mais montes, pensou na morte, pensou em como tudo
poderia ter sido diferente, envelheceu com os pensamentos de sempre, e
finalmente aqui na nossa Arouca, num lugarzito ali deitado na encosta,
encontrou o que sonhou e não pensava já possível”, diziam também. As únicas
palavras que lhe arranquei e ouvi com a curiosidade de quem descobriu um
tesouro foram aquelas com que iniciei este pequeno texto. Se já amava estes lugares,
como pude não o fazer com muito mais força? É possível acreditar que há lugares
mágicos que até fazem esquecer um desgosto de amor. Ficou a lembrança mas um
enorme vazio, nunca mais o vi por aqueles lados. A velha árvore continua lá,
sempre fiel e atenta como se soubesse que ele não deve regressar mais. Abraço.