9 de março de 2019

Desmistifique-se a "Variante"


A "Variante", que é da mais elementar justiça que se construa, e que faz parte dos maiores anseios de todos os arouquenses, desde há várias décadas, mais uma vez parece parada na encruzilhada de promessas políticas que, aparentando maior ou menor credibilidade, sempre fizeram acreditar que um dia a sua construção se iria iniciar.

Um dia que, outra vez, tarda em chegar.

Aferir a responsabilidade desta situação, é algo que deixo aos políticos e à sua retórica populista e de sofismos rebuscados. Em particular aos políticos nacionais que, ao longo dos sucessivos governos, onde todos os actuais partidos com assento parlamentar tiveram responsabilidades (não se escapa ninguém, portanto), prometeram, nos olhos dos arouquenses, que a obra seria para realizar.

Avaliar a actual dinâmica territorial de Arouca, mesmo sem “Variante”, é algo que julgo que cada um de nós pode fazer.

Por motivos profissionais, este ano encontro-me a trabalhar em Castro Verde, no Baixo Alentejo. Ano passado trabalhei em Trancoso, na Beira Alta.

Refiro-me a estes dois municípios, em concreto, porque, para além de terem uma área territorial próxima à de Arouca, sofrem igualmente de um conjunto de questões associadas à interioridade. Mas, acima de tudo, expõem exactamente aquilo que penso relativamente às alterações que a rede viária pode induzir num dado território, ou não.

Estes dois municípios são servidos por excelentes vias de comunicação rodoviária.

Castro Verde localiza-se a 5 minutos, de carro, da A2. Está encostada ao IP2. Pelo centro da vila, passa a N2, que liga Faro a Chaves (considerada, por muitos, uma das estradas mais bonitas do mundo). Tem, por isso, todas as condições para um desenvolvimento territorial exemplar. Todavia, não é isso que acontece. Aqui, as excelentes infraestruturas rodoviárias que permitem um rápido acesso ao centro da vila são as mesmas que permitem uma saída igualmente veloz. E isso acontece, porque não existem dinâmicas internas, sejam económicas, turísticas ou sociais, capazes de segurar as pessoas. A título de exemplo, posso referir que, apesar do elevado número de turistas que passa pelo centro da vila de Castro Verde, percorrendo a N2, nenhum fica mais tempo do que o necessário para tomar o café.

Regularmente, em conversas com habitantes desta vila, quando inicio uma frase com “aqui há…”, logo sou interrompido, respondendo-me “aqui não há nada, nem vale a pena continuar a pergunta”. Os próprios Castro Verdenses reconhecem a falta de dinâmica do seu território, e não estranham, por isso, a pacatez e solidão a que estão designados.

Poderia acrescentar, aqui, a falta de saneamento, o envelhecimento das condutas de água, que origina rebentamentos constantes e cortes de abastecimento, a rede eléctrica também envelhecida, o mobiliário urbano gasto e abandonado. Tudo aspectos que me fazem lembrar Arouca da década de 80 e me levam a pensar no quanto o nosso concelho já evoluiu e como, muitas vezes, precisamos de sair de Arouca para percebermos como estamos bem.

Trancoso, é uma vila igualmente muito bem servida por infraestruturas rodoviárias. Está a 10 minutos de carro da A25. Está, tal como acontece com Castro Verde, encostada ao IP2. Teria, por isso, todas as condições para um desenvolvimento territorial exemplar. Mais uma vez, não é isso que acontece e, para não maçar o caro leitor, limito-me a referir que, também aqui é notória a falta de dinâmicas territoriais internas, levando a que esta vila, com um enorme potencial turístico, esteja destinada à mesma pacatez, solidão e isolamento que encontro em Castro Verde.

Arouca, apesar de todas as dificuldades impostas por uma estrutura rodoviária que lhe dificulta o encontro de novos caminhos de desenvolvimento, tem sabido lutar contra a resignação e, mesmo com as sucessivas faltas de palavra de sucessivos governantes que por cá passaram, tem procurado criar novas dinâmicas, que lhe permitam oferecer uma boa qualidade de vida a todos quantos a habitam e visitam. Independentemente da “Variante” estar a ser construída ou não.

Claro que não está tudo feito. Nunca se pode dizer o tal. Nunca nada está totalmente feito.

É minha opinião, contudo, que não é a “Variante” o elemento central no desenvolvimento, passado e futuro, de Arouca. São as pessoas. São as dinâmicas que os arouquenses criam e que estão habituados a criar. Em nada somos inferiores a muitos municípios com características idênticas ao nosso e mais bem servidos em termos rodoviários, bem pelo contrário.

Desmistifique-se a “Variante”.