10 de outubro de 2020

Eis senão quando… morre-me o professor!

Brevemente, o ensino oficial primário na freguesia de Rossas completa 120 anos. Dá-nos esta notícia, ainda que de forma genérica e carecida de pesquisa, António de Almeida Brandão, nas suas "Memórias de Um Arouquense".

Diz-nos então aquele nosso conterrâneo que: «Data dos primórdios deste século (XX) o auspicioso momento em que foi dado início ao combate ao analfabetismo, nesta freguesia, pela nomeação do primeiro professor oficial, destinado a reger uma escola de ensino básico, como agora se diz, ou seja, uma escola primária. O seu nome era António Rodrigues Rapinaldo Godinho, veio dos lados de Ovar com a família, instalou-se na Casa do Outeiro, na qual também foi instalada a respectiva escola, na sala principal.»

Não fosse esta referência e ter-se-ia perdido, certamente, um facto importante - talvez o mais importante até -, para a história do ensino oficial primário na freguesia de Rossas. Com efeito, nas coisas da freguesia e que sobre ela se escreveram, apenas encontrei outra referência muito despercebida num assento, de 18 de Maio de 1905, onde, na sua qualidade de «professor oficial desta freguesia», aparece a testemunhar o elegante casamento de Feliciano Ferreira de Vasconcelos, da Comenda, com Ana de Pinho Tavares, do Paço. Nada mais!

Foi já por alguma felicidade que, volvido algum tempo, encontrei num periódico da sua terra natal, uma pequeníssima, mas promissora, referência, na edição de 7 de Setembro de 1902: «Em gozo de férias, encontra-se em sua casa de Cimo de Villa, o digno professor oficial da freguesia de Rossas (Arouca) snr. António Rodrigues Repinaldo Godinho.» E depois outra, na edição de 12 de Outubro do mesmo ano: «Já regressou à freguesia de Rossas, do concelho d'Arouca, onde é digno professor oficial, o snr. António Rodrigues Repinaldo Godinho». Outra, na edição de 4 de Outubro de 1903: «Afim d'exercer o seu mister, partiu na quarta-feira para Rossas (Arouca), o snr. António Rodrigues Repinaldo Godinho, hábil professor primário n'aquela localidade». E mais uma, na edição de 17 de Abril do ano seguinte: «Retirou terça-feira para Rossas (Arouca) onde é hábil professor primário, o snr. António Rodrigues Repinaldo Godinho, que aqui veio passar as férias.»

Inevitável se tornava já não imaginar e idealizar tão digna e hábil personalidade. O primeiro professor do ensino oficial em Rossas. Certamente um homem de meia-idade, de porte e postura respeitável, que por ali se terá mantido largos anos... E esta curiosidade, mas principalmente o desejo de encontrar a referência à sua nomeação para Rossas, que tão só significa a data em que se estabeleceu o ensino oficial primário na freguesia, fez-me queimar ainda muitas pestanas, iniciar a folhar o Diário do Governo até, mas, eis senão quando... uma notícia absolutamente inesperada:

«Na quinta-feira à tarde, na ocasião em que tomava banho no ribeiro do Salgueiral, foi acommettido d'uma congestão cerebral, que o victimou instantes depois, o snr. António Rodrigues Repinaldo Godinho, de Cimo de Villa. O pobre rapaz, que era um hábil professor primário, tendo sido um mez antes transferido da escola oficial de Rossas (Arouca) onde, pela sua aplicação e bom methodo d'ensino conquistára o agrado das famílias e as sympathias da povoação (...) Modesto e ilustrado, o extincto tinha a exornar-lhe sua bella alma predicados muito apreciáveis, pelo que era geralmente estimado na sua aldeia. (...)»

Assim, de chofre! Na edição de 16 de Julho de 1905 daquele periódico ovarense, onde antes recolhera boas e promissoras notas. Precisamente um mês depois de ainda se encontrar em Rossas a testemunhar aquele casamento, certamente na companhia de sua novel esposa, com a qual casara não havia ainda dois anos, e seus filhos menores. E assim também, de rompante, um facto com dados suficientes a facilitar a pesquisa dos respetivos assentos e concluir a biografia do primeiro professor oficial de Rossas. Afinal, um jovem rapaz, que por cá esteve não muito tempo, mas que marca o começo do ensino oficial primário na freguesia.

António Rodrigues Repinaldo Godinho, era natural da freguesia e concelho de Ovar, onde nasceu em 15 de Março de 1881 e faleceu em 13 de Julho de 1905, com apenas 24 anos.