8 de maio de 2020

Levadas de Arouca - por que não?

Como é do conhecimento geral, todo o mundo está a reavaliar e a readaptar o seu "modus vivendi" face aos constrangimentos provocados pela pandemia da COVID-19, pois repentinamente a sociedade viu-se obrigada a ficar de quarentena e em distanciamento social.
Desde meados de março que estou, à semelhança da maioria dos portugueses, confinada a minha casa, não por iniciativa própria, mas por necessidade de acompanhamento do meu filho que frequenta o ensino pré-escolar, estando a usufruir do apoio excecional à família pela Segurança Social.
Esta semana em que o governo "levantou" o Estado de Emergência, propus-me planear algumas saídas/passeios sanitários com o meu filho, em segurança e longe de outras pessoas, para retomarmos a atividade física, sairmos de casa e para ele conhecer e aprender a gostar da sua terra, Arouca, que tantos lugares mágicos tem para oferecer!
Como é óbvio, dada a minha naturalidade, ontem comecei por uma caminhada a dois, no fim de tarde, em Alvarenga, pelo lendário "Rego do Boi", desde a capela do Espirito Santo até à mãe d'água, entre os lugares de Bustelo e de Noninha, com regresso até à Carreira dos Moinhos.
Toda a levada é extremamente bonita e permite conhecer o rio Ardena, afluente do rio Paiva, que nasce em Noninha, na vertente sul da serra do Montemuro, e desagua no rio Paiva.
A levada ou "Rego do Boi" pode ser um percurso de rentabilização cultural, etnográfica, ambiental, turística e desportiva, destinada a pequenos grupos, preferencialmente para famílias ou grupos turma/escolas. Esta, em particular deu para falar da serra do Montemuro, da delimitação geográfica e administrativa entre concelhos (Arouca/Cinfães), da importância da água para a agricultura, da literatura de tradição popular (a lenda do rego do boi), da forma como todo o rego foi construído, dos materiais utilizados, do caudal que é aproveitado para regar os campos do vale/planalto de Alvarenga e para fazer mover as inúmeras mós de moinhos de rodízio (podendo observar o conjunto atual de 17 moinhos em carreira, no lugar dos Carreiros), e as antigas azenhas, das quais hoje restam ruínas.
Esta levada é talvez a mais emblemática e a de maior relevância para o turismo de Arouca, se considerarmos que nasce na serra do Montemuro, alimenta a "Carreira dos Moinhos", é totalmente construída com pedra da região, atravessa todo o vale de Alvarenga até culminar na Cascata das Agueiras, aos pés da Ponte Pedonal Suspensa, desaguando no rio Paiva.
Na sua extensão, desde a nascente até à Cascata das Aguieiras teremos, provavelmente, entre 10 a 13 kms de extensão, de beleza natural, paisagística, de enorme potencial para rentabilização turística, adequada aos dias em que vivemos, com ou sem guia.
Além desta levada associada à molinologia, outras há de grande interesse. Existem em Canelas/Espiunca, Moldes, Rossas e Mansores.
Uma forma de afirmar a nossa terra, a nossa cultura e o nosso património no panorama do turismo cultural e de natureza, durante todo o ano, mas também de garantir e promover o acesso aos residentes que muitas das vezes não conhecem nem fruem do que têm à mão.
Se a Madeira é conhecida pelas suas levadas, e se Arouca também as tem, por que não as rentabilizar, promover, e tornar acessível a todos, com apoio de associações locais e das juntas de freguesia?
O nosso património deve ser fator de orgulho e aumentar o nosso sentido de pertença, mas de nada vale o património se não o conhecemos, não o preservamos e não o valorizamos internamente.
Quanto aos futuros passeios sanitários, estes vão continuar, talvez por outras freguesias vizinhas e talvez forneçam matéria para mais um ou outro artigo :-)

Margarida Rocha