15 de agosto de 2021

O Chafariz da Praça, nos encontros e desencontros da sua própria história

Por esta altura, há precisamente 120 anos, estava concluído e a brotar linfa cristalina o Chafariz da Praça. As obras de estabelecimento haviam arrancado em janeiro desse ano, de 1901, e, com este, ficava também concluído o arranjo da praça central da vila, que não havia muito tempo servia de adro e cemitério da antiquíssima matriz de São Bartolomeu e da seiscentista capela da Misericórdia, mas que d'agora em diante constituiria o mais pitoresco postal de Arouca.


Por essa altura, a vila estendia-se por pouco mais do que o casario em redor das praças de baixo e de cima e duas ou três ruas apertadas e de curta extensão. Os poderes, religioso, administrativo e judicial, estavam ali concentrados, paredes meias com pequenas vendas, tabernas, pensões e serviços, pelo que a nova praça prometia ser o palco para os encontros e desencontros da vida local.

Não havia luz, saneamento nem abastecimento de água potável, sendo então este o mais essencial dos referidos serviços. Como o foi, de resto, até há não muitos anos. E por isso, o estabelecimento de bicas, fontanários ou chafarizes públicos de água bebível era considerado uma obra muito importante. Pelo que a proposta de estabelecer um chafariz no centro da renovada praça logo recolheu o agrado e empenho das autoridades municipais.

A proposta ficou certamente a dever-se a António Teixeira Brandão de Vasconcelos, tanto mais que sabia com que manancial de água se haveria de abastecer o fontanário. Com efeito, dele terá tomado conhecimento aquando da execução do Inventário de Extinção do Mosteiro, que foi da sua responsabilidade, enquanto vice-presidente da Câmara, no exercício de 1874/1875.

Porém, por volta de 1890-1892, precisamente durante a sua segunda presidência da Câmara, procuradas as águas do desejado manancial, ter-se-á percebido que a Junta de Paróquia, para além doutras habilidades, havia feito um desvio das mesmas, sem dar qualquer satisfação à Repartição da Fazenda ou à Administração do Concelho, o que desencadeou um diferendo que culminou em várias participações e queixas por parte daquelas entidades.

Paralelamente, logo a Câmara requereu a cedência das referidas águas e, nomeadamente, do manancial que abastecia o extinto Mosteiro, mas os factos acima relatados e a morosidade dos respetivos processos acabou por dificultar a cedência. Passados meia-dúzia de anos, estando já Brandão de Vasconcelos há muito afastado destas lides e a persentir os seus últimos dias, ainda não se havia concretizado. Faleceu em 1897 sem ver um chafariz a jorrar água no centro da "sua" Praça.

A cedência da almejada água só viria a concretizar-se, depois de mais alguma insistência, durante a presidência de José Gomes de Figueiredo Sobrinho, em 1899, justificando-se assim o estabelecimento do respetivo Chafariz, que começou a ser composto logo nos primeiros dias de 1901, ficando concluído e a brotar a ansiada linfa poucos meses depois.

Em Junho de 1940, correspondendo a um pedido da Representação Municipal da Acção Católica, a Câmara Municipal deliberou remover o Chafariz do centro da Praça para aí ser erigido um Cruzeiro da Independência ou dos Centenários. Porém, volvido um mês sem que viesse a autorização, por parte da Direção Geral dos Monumentos Nacionais, para mudança do Chafariz para junto da escadaria do antigo edifício dos Paços do Concelho (onde em 1989 veio a ser reimplantado o Pelourinho), a Câmara deliberou indicar àquela Representação a colocação do Cruzeiro da Independência no Largo de Santa Mafalda.

O Cruzeiro da Independência foi então erigido no Largo de Santa Mafalda, onde esteve até há cerca de dez anos, altura em que foi removido, para, até à data, não mais se levantar. Por mera coincidência, na mesma altura, e no mesmo âmbito da Regeneração Urbana do Centro Histórico então realizada, o Chafariz acabou por também ser mudado, mas apenas para o canto da Praça, estando agora no local onde outrora se encontrava o Pelourinho, que está agora onde em 1940 esteve para ser colocado o Chafariz.