Os primeiros cafés ou cafetarias apareceram em Portugal no
séc. XVII inspirados nas tertúlias francesas. Tornam se espaços de animação
cultural e artística e são os locais preferidos de diplomatas, artistas,
intelectuais e escritores entre outros. Surgem principalmente em Lisboa
espalhando se depois pelo resto do País. Os cafés nos dias de hoje têm uma
função social muito importante e estão disseminados por todas as vilas e
freguesias do País. Arouca não é exceção. Locais de muitas conversas e muitas
histórias, cá vai uma.
O Costinha, nunca
percebi porque lhe chamavam assim, era um homem de mais de 100 kilos, mais de
1.90m de altura, com umas mãos de dedos longos, que nos adivinhavam o pedido, pois
de repente aparecia como que abandonado no balcão, quando falava as palavras soavam
enormes por pequenas que fossem, e apesar disto e de outras coisas semelhantes
era sempre o Costinha como se este tratamento o tornasse mais próximo de nós, pequenos
e poucos clientes. E a voz? Parecia sempre acima do tom, quase nos lembrava o
tempo das cavernas, se como me contaram era preciso falar grosso para se ter o
respeito dos companheiros. Então quando o seu clube de futebol preferido perdia,
já ouvi trovões em noites de temporal, mais tímidos e singelos. Ficava mais
enorme, mais gigante, mais vermelho que um pôr do sol de verão, e soltava um ou
vários palavrões que nem vou repetir porque me ocupavam o resto da folha. Mas
era sempre o Costinha, o amigo, o confidente de muitas más e boas horas que o
calendário tem guardadas, e o contador de novidades, algumas tão surpreendentes
que nunca chegaram a acontecer. O Costinha. E sabia sempre tudo. Como dizia por
entre gargalhadas e ares de matreirice, era especialista nos 4 esses, o de
sexo, o de sangue, o de segredos e o mais importante, o de solidão. Quem roubou
as armas em Tancos? Lá vinha resposta certeira sem contestação, Se alguém ia
ser preso por tanta aldrabice e tanto roubo? Com ar sério, a questão era grave
lá vinha resposta pessimista, Onde esconderam o corpo? Às vezes até parecia que
era ele que o escondia tal a certeza, O homem era corrupto ou não? dependia da
côr partidária mas as hipóteses da tentação são muitas..Problemas conjugais era
especialista e desconfio que até passou uma fase em que era meio conselheiro
matrimonial ,no tempo em que se pensava que o casamento era para durar. Era
infalível, qualquer questão que aparecesse o Costinha à vontade nas respostas,
sem pestanejar. Ouvi-lo era muito melhor que assistir aqueles comentários de
ilustres na tv pois nem precisava de um ar tão sério, nem de tirar um curso de
Dr. nos fins de semana. Um dia faltou às conversas do costume, quem nos atendeu
foi o seu empregadito, uma espécie de aprendiz sem jeito que lhe servia mais de
companhia que de utilidade para descansar do trabalho, e apesar de todos
repararem nas respostas evasivas ninguém fez insinuações ou levantou questões,
esperou-se. Quando se adivinham notícias desagradáveis é melhor ir adiando,
como quem acredita em milagres. No dia seguinte e nos outros nada, e então
começaram as dúvidas que logo foram certezas. Nada de bom, doença daquela que ninguém
quer, poucas esperanças, daquela novidade não tinha ele falado, como se fosse
possível o esquecimento trazer a cura. Mas não trouxe. Alguns dias depois, não
contei mas foram poucos, a surpresa do aviso. E dessa vez, e pela primeira vez
o Costinha pareceu me pequenino a fazer juz ao carinhoso diminutivo. A foto que
acompanhava a noticia que com enorme tristeza colocaram na parede exterior do
seu café, onde, apesar do desconforto da roupa domingueira, o ar sorridente, o cabelo
penteado, o olhar a prometer novidades, pela primeira vez o Costinha me pareceu
pequenino, ali encostadinho no lado esquerdo da folha, meio a contra gosto para
dar espaço ao resto da noticia. Na foto que ilustra a noticia onde os grandes
são pequenos e os pequenos grandes, tudo igual. Triste dia. Nunca mais vai ser
igual o serão no café naquela Vila. Falta por lá o Costinha.