6 de novembro de 2018

A Pensar Alto...

História que pode ser verdade...Terras mágicas.

“Aqui por Leirosa encontrei finalmente o que sempre procurei, gente boa, terra boa, um ar tão limpo que até me lavou os desgostos. Não tenho nada mas sou feliz com isto”.
Via o chegar sempre aos domingos à tardinha. Muito devagarinho abria o portão com aquela  intimidade de quem conhece os sítios, e sem ruído, sem olhar, parecia que os seus passos só conheciam aquele banco de pedra debaixo da enorme japoneira. Sentava se, e afastava com aquelas mãos pequenas e sujas com o pó de muitas canseiras, aquele tapete de flores que a árvore, como se adivinhasse a sua chegada sempre espalhava naquele dia. Tinha mais uma vez à sua espera aquele enorme tapete de cores avermelhadas. Remexia o velho e sujo saco que lhe servia de companhia e mala de viagem, às vezes encontrava o que procurava, outras vezes nem sei, e lá ficava a aguardar que a noite não faltasse àquele encontro que marcara há muito tempo atrás e se transformara numa rotina permanente. De domingo à noite até segunda de tarde a sua casa, o seu conforto, a sua família eram aquelas coisas que o rodeavam e nunca o tinham abandonado, substituindo sei  lá amigos de que já não se lembrava. Ah, esquecia me, preparava o banco de pedra com uma manta decorada com enormes buracos e colocava-se sempre de maneira que pudesse ficar a ver o pequeno vale de Lourosa de Campos, mas ao mesmo tempo, o brilho das muitas estrelas que mal vinha a noite, por lá passavam num desfile de brilhos e segredos que talvez só ele conseguia descobrir. Na manhã seguinte por muito cedo que fosse estava sempre sentado no banco a olhar na mesma direção como se não conseguisse soltar o olhar do que tanto o encantava. Tinha uns olhos muito pequeninos ou fazia por nunca os abrir na totalidade, via no entanto os dias e noites partir sempre com a mesma expressão de quem é feliz. Qualquer comida ou bebida  lhe abraçava os pensamentos e dava forças para repetir as visitas, sem incómodos, sem conversas, sem explicações. Diziam por lá os mais antigos que tinha sido um desgosto de amor a causa de tal modo de vida. Que mais poderia ser penso eu agora, foi de certeza. “Que veio de longe, subiu e desceu montes e mais montes, pensou na morte, pensou em como tudo poderia ter sido diferente, envelheceu com os pensamentos de sempre, e finalmente aqui na nossa Arouca, num lugarzito ali deitado na encosta, encontrou o que sonhou e não pensava já possível”, diziam também. As únicas palavras que lhe arranquei e ouvi com a curiosidade de quem descobriu um tesouro foram aquelas com que iniciei este pequeno texto. Se já amava estes lugares, como pude não o fazer com muito mais força? É possível acreditar que há lugares mágicos que até fazem esquecer um desgosto de amor. Ficou a lembrança mas um enorme vazio, nunca mais o vi por aqueles lados. A velha árvore continua lá, sempre fiel e atenta como se soubesse que ele não deve regressar  mais. Abraço.