No passado mês de Dezembro da era comum, recebi, na minha caixa de e-mail's, uma mensagem de um leitor brasileiro deste blogue «Defesa de Arouca», descendente de famílias arouquenses, que me fez uma série de questões sobre as famílias de origem «cripto-judaica» e «cristã-nova» de Arouca, ou seja, sobre a Cultura Judaica e o Povo Judeu 'Shomer Torá uMitzvot', do qual eu descendo, ao qual pertenço e ao qual estou muito ligado, de modo directo, faz, agora, precisamente, 17 anos. No presente e em termos vitalícios, como «Noaíta-Chassid / Chassid Umot ha-Olam»...
Esse leitor perguntou:
" Li os seus posts no Defesa de Arouca sobre elementos cripto-judaicos em Arouca e gostei muito por ter muito interesse no tema. Reparei também que você menciona que encontrou as suas próprias origens cristã-novas em Arouca, por acaso você teria informações também sobre outras famílias com a mesma origem no concelho?
Meu avô paterno nasceu no Burgo e por parte do meu bisavô sou descendente de Nunes Ferreira de Urrô/Santa Eulália/Burgo e Duarte da Rocha também do Burgo, e por parte da minha bisavó dos Gomes de Sousa Monteiro de Figueiredo (Burgo) que foram senhores das Casas da Moita, Aldeia, Devesa, Fonte, Figueiredo, Cabo, etc e também dos Almeida Magalhães da Casa de Sela (Sela, Urrô) e Quinta de Souto de Rei (Souto de Rei, Várzea), que pelo brasão entregue ao meu ancestral Cap. Domingos de Almeida Magalhães (da Sela) seriam também descendentes dos senhores das Casas da Trofa e do Côvo.
Ficaria muito contente caso você tenha alguma informação em relação à essas famílias, especialmente em relação às origens cristã-novos que creio serem bem prováveis."
Respondi-lhe do seguinte modo:
" Boa tarde. Sim. Cada vez mais se confirma a origem cripto-judaica e cristã-nova das Casas brasonadas do Norte de Portugal e da Galiza.
O cripto-judaísmo e os cristãos-novos são um fenómeno sobretudo do Norte de Portugal e não do Sul ou de Lisboa, tal como pude constatar em vários estudos académicos que realizei com outros colegas sociólogos...Um dos quais sobre a minha família cripto-judaica materna: os «do Valle Quaresma», senhores da Casa de Paços - Moldes - Arouca. As famílias brasonadas de Arouca terão, em grande parte, essa origem cripto-judaica e cristã-nova. "
Igreja da Misericórdia de Vila Real de Trás-os-Montes, que era uma antiga sinagoga sefardita ocidental
Foto: Visitar Portugal
Como referi neste blogue, uma parte da família do poeta Fernando Pessoa, da Casa e Quinta do Castelo, de Fermêdo - Arouca, era de origem «cripto-judaica» e «cristã-nova», como o próprio poeta Fernando Pessoa descreve na sua célebre nota biográfica, ao referir a sua origem familiar num «misto de fidalgos e judeus»...E grande parte das igrejas e congregações das Misericórdias do Norte de Portugal eram antigas sinagogas, que eram propriedade dessas famílias brasonadas do Noroeste Peninsular. Um desses melhores exemplos é a igreja da Misericórdia de Vila Real de Trás-os-Montes, localidade de onde era originário o Dr. Ângelo Miranda, que é o célebre médico transmontano que, durante o século XX da era comum, se tornou arouquense e que era descendente de Judeus religiosos praticantes, de uma família brasonada.
Repito e sublinho bem: a cultura «Cripto-Judaica» milenar é uma componente muito relevante no Noroeste da Península Ibérica, que está no inconsciente colectivo das populações nortenhas e galegas, mesmo que, na actualidade, muitos não estejam conscientes dessa herança milenar e estruturante, mas que permanece, como herança, de modo espontâneo, na idiossincrasia cultural das populações do noroeste ibérico, em muitos e variados aspectos, tal como ocorre em Arouca. Ainda está por realizar um estudo minucioso e isento, com grande rigor científico, sobre as congregações, irmandades, igrejas e capelas da Misericórdia do Noroeste da Península Ibérica, bem como sobre as congregações, irmandades, igrejas e capelas do Espírito Santo (o Ruach Ha-Kodesh hebraico), visto que grande partes delas eram antigas congregações e sinagogas sefarditas ocidentais, que foram preservadas pelos «cristãos-novos», durante séculos.