Naquele dia encontrei sem querer um velho barco meio perdido
encalhado na beira do mar. É estranho como ao lado de um mar tão imenso o
barquito se perdeu e sem forças se encostou de lado a meia dúzia de gastas rochas
e por lá ,ponto de descanso para as gaivotas intervalarem daquelas viagens
de ida e volta. Chamou me a atenção o leve ruído da água sempre repetida a
afagar lhe o casco, a única maneira que encontrou para o confortar e ficar em
repouso, quem sabe esquecer as muitas dificuldades que o tinham conduzido
aquele sítio. Para nós habitantes de um Vale rodeado de montanhas é sempre com
grande agrado que reencontramos o mar, velho conhecido que por muitos sustos
que pregue é sempre igual aquele velho amigo a quem perdemos o rasto e de repente
encontramos mais velho mas com o mesmo olhar de ternura imensa. Não conheço
ninguém que não goste de ir dar aquele passeio domingueiro sem escolher dia ou
hora e que sem dar por isso fica parado a rever os murmúrios das ondas, os
brilhos nunca repetidos das águas e aqueles cabelos brancos que a espuma
brilhante tão bem imita. Desde sempre fomos para ele atraídos, somos todos
descendentes de marinheiros, e mares navegados ou por navegar, é cá connosco.
Lembrei me disto quando se deu mais um passo para nos aproximar do mar, um
passo mais pequeno do que gostaríamos, mas mesmo assim mais um. Lá vem mais um
pedaço de Variante, agora com outro nome, pequeno, atendendo ao tamanho das
promessas, mas suficiente já que lhe vislumbramos o restante, agora que o que
falta está encurralado no meio e mais cedo ou mais tarde justiça será feita,
nem que seja por vergonha de quem tem de tomar as decisões. Claro que a razão principal para esta melhoria não é
levar nos, pobres do interior ver as ondas, são razões de economia e desta vez de mãos
dadas com o desenvolvimento que esperamos por consequência receber de volta. Já
ouvi e li várias vezes que Arouca é uma terra que não ficou parada á espera da
estrada que nos iria aproximar do litoral, espécie de oásis onde tudo acontece,
pelo contrário, fez se ao caminho e com os caminhos manhosos que por cá vamos
tendo, se conseguiu desenvolver e fazer até escola com ideias de muito sucesso.
Grande verdade. Mas se os deveres são para todos, os benefícios também o devem
ser e nada justifica este imenso atraso na concretização da nossa maior
aspiração, enquanto Arouquenses. Vivemos num País retalhado por magníficas auto
estradas, algumas até paralelas, como se pudessem competir umas com as outras, e
nós, olhamos para essa imensidão de dinheiro gasto, olhamos para os anos em que
sonhamos, em que tivemos esperança que as promessas iriam ser cumpridas, e com
muito desencanto recebemos 9,9 km e agora mais meia dúzia para ver o tal
litoral mais perto. É pouco, em tanto tempo de espera, por muita festa que se
faça, por muitas contas que se acrescentem ás distâncias, é pouco. Nos próximos
3 anos vamos aguardar a concretização deste novo troço mas temos que continuar
a lutar para que os poderes do nosso País sejam constantemente inquietados por
esta enorme injustiça que anos após anos poucos quiseram corrigir. Nós os mais
velhos gostaríamos que esta luta não tivesse que ser continuada pelos nossos
filhos ou netos mas se tal acontecer que lhes deixemos o legado de quando se
trabalha por uma causa justa não há cansaço, nem vontade de desistir. Queremos
a conclusão desta via e com ela concluída mais o muito que se tem feito sem
ela, iremos dar o passo que falta para o tal desenvolvimento que traz emprego,
qualidade de vida, e oportunidades mais equilibradas e justas que há várias
gerações Arouca reclama. Queremos todos ver o mar…ali mais perto. Não vamos
desistir.
Carlos S. Sousa