Interior da Igreja de Fermedo, Arouca. |
Portugal é ainda um país de imensa religiosidade, tendo
nestes tempos da Quaresma um sem número de eventos que recriam tradições
pascais misturando o religioso com o profano e em muitos casos aproveitando
estas comemorações para mais uma forma apelativa do turismo que por cá nos
visita. Cá por Arouca e para além das festividades tradicionais da Páscoa, com
as missas, confissões, a procissão do
Senhor e a visita Pascal ainda muito habitual, dois acontecimentos se
distinguem, a Procissão dos Fogaréus na Vila e o Ementar das Almas em Fermêdo,
evento não muito conhecido mas enraizado e a ganhar de novo grande importância naqueles
espaços. Desde sempre a religião cristã foi pródiga em rituais com uma carga
enorme de superstição assimilando com facilidade alguns desses valores,
surgindo com naturalidade a ementa ou encomendação das almas, onde o nosso povo
entre outras coisas se penitenciava de grandes pecados ou tentava cumprir as
promessas feitas em horas de dificuldades, que são sempre uma última solução.
De alguns anos a esta parte o Grupo Etnográfico de Danças e Cantares de
Fermêdo, na altura da Quaresma, com os seus membros e participantes
interessados, faz uma reconstituição desta tradição, e este ano, durante dois
dias, repetiu as rezas e seguiu os
preceitos de um razoável encomendador. Saindo da porta da igreja de Fermêdo
munido da vara adequada e depois de feitas as invocações respetivas às almas, partiu
em direção aos montes da vizinhança, em silêncio, sem olhar para trás, entoou
uma reza que se seguisse a tradição devia ser ouvida em cinco freguesias e
ouviu ele também as pessoas que quiseram colaborar rezando pelos falecidos e entoando cânticos
religiosos, gerando se nos intervalos um silêncio espesso que muito ajuda a uma
atitude de reflexão, transformando a noite mesmo amena, numa nascente de
receios e tremores. Terminada a volta o ementador regressa à igreja e entrega
as almas a Deus, completando este ritual de crença e história das gentes desta
região. O atrás descrito não passa de um resumo diminuto e provavelmente pouco
esclarecedor de uma das mais interessantes atividades no tempo da Quaresma no
nosso Concelho. Fiquei com curiosidade acerca desta realização e logo que
possível irei presenciar pessoalmente tal representação de mais esta crença
popular, tão perto de nós, e de que poucos ouviram falar. Este pequeno texto
tenta apenas despertar a curiosidade e informar, mais nada. Agradeço as
informações prestadas pelo Sr. Valdemar da casa da cultura de Cabeçais que me
esclareceu com muita oportunidade e consultei também o livro de Marina
Perestrelo,”Alma do Povo a que pertenço.” Conhecer a nossa terra é um
exercício que nunca devemos dar por concluído, de repente mais uma descoberta e
mais um pedacinho da história que nos formou e a que pertencemos também. Se
visitar estes lados, aproveite e conheça a igreja de Fermêdo, iniciada por
volta de 490 d.C. e com uma bela história a envolvê-la até aos dias de hoje. Se
conhecermos o passado enfrentamos o futuro com mais segurança e experiência,
daí a importância da nossa história.